Assistir ao documentário “Eu não sou seu negro” deveria ser obrigatório à todos. Indicado ao Oscar e ainda em cartaz em alguns cinemas, o longa metragem traz como base a história da carta de James Baldwin, deixada para seu agente. Posteriormente, esta chega nas mãos do diretor haitiano Raoul Peck, que transformou essas palavras em filme. Baldwin foi um romancista, dramaturgo, ensaísta, poeta e crítico social afro-americano, suas obras de ficção trouxeram dilemas sobre as pressões sociais e psicológicas vividas por negros, homossexuais e bissexuais, que buscam aceitação no cenário na metade do século XX.
O longa metragem perpassa, com temas centrais, por relatos de vida e morte de seus amigos, e figuras históricas, Medgar Evers, Martin Luther King Junior e Malcom X. Figuras que instruíram as pessoas, foram traídas por elas e, mesmo assim, por elas deram a vida. Além disso, é a voz de Samuel L. Jackson que narra as reflexões trazidas, utilizando como fio condutor a própria vida do escritor.
O filme utiliza imagens de outros, de acordo com as falas de Baldwin, ilustrando-as e também o seu ponto de vista, além de imagens do passado e presente. Uma forma de demarcar as épocas, mostrar a falta de representatividade e, até mesmo, a repulsa que existia pela imagem de alguém negro. “O sistema da realidade não possui espaço para o negro”, como é dito. O choque ao depararmos com imagens de massacres que viraram história, e outras mais atuais, como o recente caso do Missouri em 2014.
O próprio escritor diz que, quando era criança, seus heróis eram os brancos vistos nas telonas, pois eram eles os fortes, as inspirações, a tentativa de enfatizar esse reflexo seletivo da realidade. Algo ainda muito presente nos dias atuais, como foi visto no caso do “Oscar so white” e até os filmes de super heróis, nos quais há supremacia da imagem do “branco”.
A atuação do filme acaba basicamente ficando nas mãos de Samuel L Jackson. Ele, como narrador, nos leva em suas palavras e entonação para dentro das emoções despertadas pelo documentário. O restante fica à mercê das imagens de arquivos de televisão, filmes, entrevistas e fotos. São meios de criar verossimilhança e demonstrar veracidade ao que está sendo dito e mostrado.
O roteiro tem todo seu foco nas relações sociais e a questão étnica nos EUA. Um tema que, mesmo em 2017, ainda é preciso ser abordado e trazido para a telona. Principalmente, em dias de política norte-americana nas mãos de conservadores e do líder: Donald Trump. Inclusive, ele está presente em uma cena.
Sobre a filmagem, há uma seleção de cenas com enfoques em primeiro plano, para que as emoções de quem fala sejam evidenciadas. Isto cria no espectador uma empatia e proximidade ao locutor, uma forma de olhar nos olhos de quem fala e ser levado pelos sentimentos dentro de suas palavras. Assim como já é colocado na capa do documentário, em que há um recorte do olhos de James Baldwin, pois, somos guiados pelo seu ponto de vista da história.
Devido à época da história retratada, o documentário é majoritariamente preto e branco. O uso da fotografia em preto e branco cria uma maior evidência na diferença de tons de pele entre os que aparecem e traz uma maior dramaticidade a imagem.
Junto a esses fatores, e outros, mais um que vale ressaltar é a montagem do documentário. Com a intercalação das imagens, a seleção de acontecimentos históricos, narração de fatos pessoais e a justaposição de acontecimentos mais recentes em meio aos do passado, colocam em questão para refletir a urgência desse preconceito e intolerância velada até hoje.
Resumindo bem seu ponto de vista, existe a frase já no final do filme de que: “’branco’ é metáfora do poder”. Já naquela época de suas falas, ele caracteriza os EUA como um país intolerante. E como o negro possui uma paranoia furiosa, que nunca os fizeram sucumbir. Neste momento, é usado trecho do filme “Elephant” do diretor Gus Van Sant.
Baldwin diz que o futuro pode ser sangrento, se nada fizerem, mas que podem fazer algo e precisam de garra. Acima disso, o futuro só depende do povo e dos representantes americanos. Através desse material do documentário, junto a tantos outros, esperamos que mudanças e soluções sejam, enfim, encontrados, e dar um fim as distinções. Assistam, indiquem, revejam, e guardem na memória as falas e imagens do que essas pessoas passaram, e, infelizmente, ainda passam. Não só podemos mudar, como devemos mudar.
Por Gabi Fischer
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