Peça que cruza a força ancestral de Orixás femininas com a construção de Cidade Tiradentes por mulheres negras
O Núcleo Teatral Filhas da Dita estreia o espetáculo “Canto das Ditas – Fragmentos Afrografados de Cidade Tiradentes” no dia 12 de julho(sexta, às 21h), no Sesc Ipiranga, em São Paulo. Com direção e dramaturgia de Antonia Mattos, a montagem faz somente três apresentações, seguindo até o dia 14, no Teatro da unidade.
Para refletir sobre como a África se manifesta no dia a dia das moradoras de Cidade Tiradentes, o grupo encarou o desafio de “afrografar” o bairro – referência ao termo “afrografias” da poetisa e ensaísta Dra. Leda Maria Martins, que coloca em evidência e consciência a nossa herança africana. O trabalho do Núcleo Filhas da Dita mapeou esse legado ancestral por vários ângulos: ao próprio redor, junto a parentes, pessoas próximas e até desconhecidas que caminham pelo bairro.
A partir da investigação proposta, Canto das Ditas coloca em cena histórias de mulheres negras de Cidade Tiradentes que se entrecruzam com histórias de Yabás (orixás femininas). A montagem busca o reflexo das histórias do cotidiano em um espelho “mítico” das personagens sagradas.
A diretora Antonia Mattos explica que os depoimentos colhidos pelo grupo aparecem no texto e na dramaturgia de forma não linear, fragmentada:
“A narrativa é espiralada, pois procura se relacionar com um tempo mítico, da memória e da ancestralidade. As personagens reais correspondem, de forma arquetípica, às personagens míticas. Recorremos ao ‘espírito ancestral feminino’, às ‘grandes mães da humanidade’, às yabás para contar e cantar as histórias dessas mulheres, as Ditas, que fundaram Cidade Tiradentes”.
As atrizes que interpretam as quatro mulheres – Bendita/Nanã, Marta/Iemanjá Maria/Iansã, e Joana Nega Su/Obá – são Ellen Rio Branco, Lua Lucas, Luara Sanches e Thábata Letícia, respectivamente. Segundo Antonia, a poética cênica é atravessada por elementos e saberes ancestrais, num tempo/espaço espiralado que aponta para um movimento rumo às reminiscências de um passado sagrado, para fortalecer o presente e deslumbrar o futuro. A origem da humanidade na África e a fundação de Cidade Tiradentes são contadas simultaneamente: o passado sagrado se revela no presente e passado recente.
A origem do bairro passa pela força dessas mulheres negras que alí chegaram, se instalaram e fizeram a história local. E são delas as histórias contadas na encenação “Canto das Ditas: Fragmentos Afrografados de Cidade Tiradentes”, onde a música tem papel fundamental, trazendo a voz e o canto dessas mulheres em um cenário lúdico que se estabelece entre o ritual e o urbano contemporâneo. “Tempos e lugares diferentes mostram que, apesar de toda a repressão sofrida, as mulheres sempre se reuniram em grupos para buscar alternativas, para desafiar o sistema patriarcal e mudar sua condição, seja na sociedade secreta africana de Eleko, seja na Casa Anastácia (Centro de Defesa e Convivência da Mulher) em Cidade Tiradentes”, reflete Antonia Mattos.
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