Quando o roteiro torna-se o vilão
O cinema vive um momento único, no qual bilheterias astronômicas fazem a carreira de diferentes tipos de produções. Um dos grandes motivos para esse “fenômeno” pode ser direcionado a escolha dos estúdios por adaptações das famigeradas histórias em quadrinhos, lideradas pelas gigantes “Marvel” e “DC Comics” que veem proporcionando nos últimos 20 anos uma nova fase com produções de extrema qualidade (Com algumas exceções, claro) e tecnologia capaz de transformar determinadas cenas, que seriam facilmente tida como artificiais, em um material de máximo realismo para nossa atualidade.
Considerada uma das franquias de super-heróis de maior sucesso de todos os tempos no cinema, desde que foi lançada no ano 2000, os X-men são parte importante dessa história e da nova fase do mercado cinematográfico que tende a continuar crescendo. A série criada em hq por Stan Lee e Jack Kirby, em 1963, foi adaptada para o cinema e alcançou números lucrativos em cada um de seus filmes, mas dividiu a opinião do público e crítica ao fechar a primeira trilogia com o forçado “X-men: Confronto Final” em 2006. Com isso, desde sua retomada com “First Class” em 2011, os produtores vem tentando reconstruir a série de forma que essa supere sua precedente. E, hoje, chega aos cinemas o terceiro filme dessa nova fase e “X-men: Apocalipse” não fecha o ciclo como deveria, ao invés disso abre brecha para uma continuação apostando no possível estrondo que esse fará nos cinemas.
O repaginado “X-men”, desde First Class, conta o início da história dos alunos de Charles Xavier e como os mutantes foram apresentados ao mundo, o medo que geraram, a discriminação que sofreram e as superações de ambas as partes. Bem como, o surgimento da amizade entre o enigmático Magneto e o esperançoso professor Xavier e sua escola para superdotados. Diferente do primeiro filme e do segundo (Dias de um futuro esquecido), “Apocalipse” consegue até se equilibrar na corda bamba mas não se garante por completo devido a certas incoerências e um roteiro mediano.
A trilogia traz um dos mais poderosos vilões enfrentados pelos heróis, En Sabar Nur, o “Apocalipse”, o primeiro mutante a existir, e quatro outros que foram convocados por ele para ajuda-lo a erradicar os humanos da terra. Magneto, Tempestade, Anjo e Psylocke acabam, assim, formando os quatro cavaleiros do apocalipse. A história se passa em 1983, em meio a um momento no qual alguns mutantes ainda sofrem para se adaptar com seus grandiosos poderes. Com o surgimento do novo problema, eles precisam unir forças para enfrentar a nova ameaça.
“X-Men: Apocalipse” se destaca em muitos fatores, mas também tropeça em outros que podem fazer fãs mais fervorosos discordarem da escolha dos estúdios. O primeiro grande destaque do filme fica por conta da super produção, realizada com altos padrões de requinte. Tecnologia de primeira qualidade, liderada por uma equipe que sabia o que estava fazendo na maior parte da produção. Dá gosto de ver o trabalho realizado em cima dos efeitos. Contudo, o uso do CGI em excesso faz perder uma das maiores qualidades dos dois primeiros filmes da nova safra, o roteiro.
O roteiro de Simon Kingberg, acaba por ser o grande problema do projeto por querer complicar demais, misturar situações desnecessárias e fazer de uma das obras mais interessantes dos quadrinhos uma grande caricatura. Com diálogos fracos, que insiste em piadas bizarras que mais parecem ter saído de determinados shows de horrores, e uma narrativa que divide a incoerência com a tentativa de fidelidade, Kingberg constrói algo que nos faz lembrar de fracassados contextos criados para levar a televisão àqueles super-heróis da década de 70 e 80. Lembram?!
Bryan Singer volta a cadeira de diretor para um bom trabalho, ponto! Sua realização, embora sofra da síndrome do mais do mesmo, fornece um boa composição na escolha de ângulos importantes no âmbito psicológico, e ao adotar planos essenciais para a desconstrução das personagens principais e o momento vivido por cada uma delas. Marcando, com sensatez, o ponto de virada que define o avanço dos X-men.
O ótimo Newton Thomas Sigel (“Drive” e “Dias de um futuro esquecido) é o responsável pela direção de fotografia que consegue caminhar em equilíbrio com o diretor, optando por movimentos de câmera excepcionais que fazem grande diferença a história. Contudo, pesa a mão no jogo de sombras, ao tentar criar um ar misterioso para o filme. Novamente, temos aqui, o problema do excesso que torna tudo um grande exagero, e o que deveria ser umbroso acaba por originar uma atmosfera pretensiosa que impede uma identificação maior com a produção.
O elenco traz novos atores para viver os mutantes, entretanto são os antigos que roubam a cena. James McAvoy está bem na personagem, mas não surpreende muito, ao contrário de Michael Fassbender que rouba todas as cenas em que aparece. Jennifer Lawrence se destaca bastante ao jogar ao lado de atores que demonstram grande inexperiência de trabalho, mesmo estando esses no mercado. Oscar Isaac, sufocado debaixo de uma péssima maquiagem que o deixa com cara de palhaço fanfarrão, não consegue demonstrar ao todo sua qualidade como ator, mas faz de tudo para sustentar a personagem. Algumas palmas também fica para Hugh Jackman em uma aparição relâmpago que proporciona um dos momentos de mais interessantes do filme. Os atores Tye Sheridan (Ciclope), Alexandra Shipp (Tempestade) e Olivia Mumm (Psylocke), revelam um trabalho ruim, mostrando a inexistência de uma construção sólida de suas personagens.
A direção de arte fica por conta de Michele Laliberte, Ravi Bansal e Veronique Meunier, os quais conseguem trabalhar locações e objetos sem perder a verossimilhança. A escolha por paletas de cores mais escuras, com detalhes mais claros, cria um aspecto denso, de fim do mundo, que poderia ser melhor aproveitado pela fotografia e, principalmente, pela frustrante maquiagem que insiste em piadéticas caracterizações.
O figurino de Louise Mingenbach, além de fornecer um bom trabalho ao oferecer um toque retrô as cenas, elabora o que talvez seja os melhores uniformes criados até o momento para essas personagens. Contudo, esperava-se mais do que o simples couro preto.
A trilha sonora, assinada por John Othman, parceiro de longa data de Brian Singer, é interessante, mas não ao ponto de instigar o público como conseguiu fazer no filme anterior.
“X-men: Apocalipse” não é o melhor filme da nova safra dos mutantes, mas está longe de ser o pior das produções sobre super-heróis. Embora transforme o roteiro em um vilão mais cruel que o Apocalipse apresentado, deixando o conteúdo de lado para viabilizar uma produção pipoca cheia de ação e repleta de efeitos, ainda sim é um filme interessante e que merece ser assistido no cinema. Nem que seja pela belíssima cena de Mercúrio, descaradamente copiada de “Dias de um futuro esquecido”, mas sejamos honestos: o que é bom, merece ser mantido.
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