“O receio de que a minha noção de felicidade estivesse totalmente em desacordo com a noção de felicidade do resto das pessoas fazia com que, noite após noite, eu me revirasse de um lado para o outro na cama, gemendo, quase a ponto de enlouquecer. Será que eu era feliz? ”
Existem muitos livros, séries e filmes que retratam a depressão e os abusos, entretanto nenhum dos que vi ou li foram tão explícitos como “O Declínio de um Homem”. O livro oferece um relato detalhado sobre os efeitos nocivos que eles causam no ser humano, alterando suas vidas eternamente. Só que, mais importante, ele nos mostra o que acontece com alguém que não busca ajuda e com aquele que não tem alguém por perto para apoiá-lo durante esse turbilhão de acontecimentos.
Houve, não muito tempo atrás, um debate sobre a romantização do suicídio e da depressão. Embora Osamu Dazai trate exatamente sobre esses assuntos, ele não os romantiza. Sim, o livro é bem escrito e vale cada palavra, se consolidando como uma grande obra, mas, através de uma narrativa em primeira pessoa, o autor se aproveita da aterradora sinceridade com a qual cada um fala consigo mesmo para nos mostrar as feridas de Yozo, sem maquia-las.
“Guardava minhas angústias em uma pequena caixa dentro do peito e, escondendo com discrição minha tristeza profunda e meu nervosismo, aperfeiçoei-me em ser um personagem excêntrico e brincalhão, permanentemente revestido de um otimismo inocente. ”
Acompanhamos a personagem por três etapas de sua vida: pelos acontecimentos da infância, onde vemos uma criança que não se ajusta à sociedade buscar ser aceito; durante a adolescência, um jovem sem esperanças que tenta se reconectar com a vida; E o adulto, que se julga derrotado pela própria existência. Vemos, então, que o título do livro já nos avisa sobre o que encontraremos nele.
Mas fica o alerta: este é um livro que deve ser lido com cuidado. Um dos maiores motivos disso é o elemento autobiográfico do romance. Dazai era um alcoólatra que tentou o suicídio diversas vezes, até o conseguir em junho de 1948. Podemos encontrar em suas palavras escritas o pessimismo diante da vida. Porém, o que poderia ser um grande empecilho, se tornou sua maior força. Este é um livro do qual não é possível sair do mesmo, é um daqueles que nos força sutilmente a refletir e que nos marca o coração com a tinta de suas palavras. Assim, ao acompanharmos Yozo, entendemos o peso real, mas invisível, das doenças psicológicas. E, com essa compreensão, nos faz, também, respeitá-las mais. Após essa leitura, nunca mais alguém vai julgar a depressão como frescura ou a ansiedade como fraqueza.
“Eu era quase respeitado pelos colegas. Mas também a ideia de ser respeitado era para mim algo assustador. A definição de ser ‘respeitado’ era a de enganar a todos quase completamente, até ser desmascarado por algum ser onipotente e onisciente, que me reduziria a pó, numa vergonha pior do que a morte. ”
Nós, da W00! Magazine, pensamos diversas vezes se deveria ou não recomendar este livro. É aquele livro que é mais fácil de falar sobre em uma conversa, com alguém que você conhece. Não é impossível que sua fragilidade possa ser interpretada como uma perversidade. Seu sofrimento documentado, como uma espécie de sadismo do autor.
Só que essa não é a verdade que essas páginas transmitem. Ao ler “Declínio de um Homem” somos lembrados que, sim, esse é um possível desfecho. Mas também recebemos um verdadeiro tratamento de choque para reagirmos. Para seguir outro dos inúmeros caminhos possíveis. Porque, sim, existem outros. E estão todos aí, à nossa espera.
Por Pedro Soler
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