Nem sempre é fácil ter diálogo com familiares, às vezes a comunicação com um amigo, com um namorado(a), até mesmo com um desconhecido se mostra mais aberta do que com aqueles que temos laços sanguíneos. Em a “A Ponte”, peça em cartaz no CCBB do Rio de Janeiro, podemos ver um pouco disso através da história de três irmãs de personalidades e realidades muito distintas que são colocadas em um ambiente de nervos à flor da pele quando precisam cuidar de sua mãe doente. Ao mesmo tempo em que a situação pede união, as três precisam refletir sobre conflitos passados para eliminar antigos fantasmas e terem, assim, uma boa convivência.
A peça reúne momentos de monólogos, nos quais cada uma das personagens possui seu tempo para desabafar com o público sobre seus dramas mais profundos. Com uma veia cômica que dá leveza as passagens, sem precisar se desprender do drama, a peça transita entre os acontecimentos de forma equilibrada e natural. O melhor da união desses aspectos é como os personagens conseguem flutuar entre eles, através de diálogos fortes, crescentes, e que quase nunca terminam da maneira que começaram (a ponto de uma cena cômica se transformar rapidamente em um momento de tristeza e dor ou um drama inicial ser concluído com um misto de lágrimas e gargalhadas).
Todavia, o grande trunfo do texto e seus ricos diálogos é a forma como eles inicialmente constroem as personagem em suas certezas, e na forma como elas interagem, para depois, através de aspectos análogos a história e diante da nossa vista, desconstruir a confiança de cada uma.
Enquanto isso, a ponte que dá nome a peça serve de aspecto simbólico como um trauma passado que une todas as três mulheres. Cada qual com sua lembrança sobre esse símbolo. A ideia de que cada uma tem a sua visão distinta daquele local, nos remete também a diferença de personalidade entre as três.
Maria Flor (Louise), Bel Kowarick (Theresa) e Debora Lamm (Agnes) possuem uma sintonia única, a interação entre as três reúne um conjunto de caracterização, boas atuações e naturalidade que, por sua vez, implicam realidade às personagens, nos remetendo a pessoas do cotidiano, como um tia ou uma mãe que provavelmente seriam parecidas com uma daquelas três mulheres.
Uma cozinha, com uma mesa central e uma harmonização de tons vermelhos (que vai desde as frutas dispostas na mesa, até os recipientes espalhados por toda parte), dá vida ao cenário que funciona bem e agrade bastante – visualmente falando. O cheiro do café provoca o público em um primeiro momento, trazendo a gostosa lembrança da nossa casa, da nossa própria mãe. Uma tela colocada em frente a plateia, por baixo da mesa, serve não só para dividir os atos do espetáculo como também para trazer humor com aquilo que não se vê – como a série que Louise (Maria Flor) acompanha no quarto.
De forma satisfatória, o texto de Daniel MacIvor prende o público com uma história bem construída e de fácil compreensão. A direção de Adriano Guimarães acrescenta a esse cenas com discussões fervorosas, muito bem arquitetadas, que ficam ainda melhor com a potência de voz e expressões das atrizes. A comicidade é bem imprimida durante alguns momentos, enquanto os monólogos (de forma metafórica) insere a personalidade daquelas mulheres e quebram a barreira da quarta parede.
No fim, a história passa uma mensagem fácil de ser compreendida e, ao mesmo tempo, comum a uma sociedade em que muitas são as pessoas que possuem alguma dificuldade de interação familiar, ainda mais quando as características são tão distintas.
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