Quem conhece o escritor Neil Gaiman sabe que suas obras fantásticas na literatura e nos quadrinhos possuem subtextos que dizem muito sobre o homem em sua sociedade. Ele fala de Deuses e outros seres mitológicos para discutir a humanidade. Não é diferente em seu conto “Como Falar com Garotas em Festas”, que mostra dois rapazes na década de 70 curtindo o Punk Rock e indo atrás de garotas. Um deles é popular com elas, enquanto o outro não consegue nem dirigir uma palavra para conquista-las. Eles acabam em uma festa cheia delas, mas parece que elas não são do nosso planeta.
O conto é subjetivo e seu final se vale de interpretações, o que é bem diferente da adaptação ao cinema dirigida por John Cameron Mitchell. O filme amplia o universo do conto e mostra todas as implicações da tal festa, assim como aprofunda os personagens. Os rapazes Punks Enn (Alex Sharp) e Vic (Abraham Lewis) conhecem toda uma raça alienígena que se reúne em um casarão para um ritual estranho sobre conhecimento e evolução. Essa raça toma os corpos de humanos, experimentam as suas vidas e costumes, procriam, e depois vão embora. A alien Zan (Elle Fanning) não está feliz com esse processo e pretende aproveitar a breve vida na terra, o que a faz cruzar o caminho de Enn. Juntos eles vão seguir uma jornada com alto teor de bizarrices.
Enn é contraditório ao se dizer punk, já que possui atitudes conservadoras sobre relacionamentos e comportamentos sociais, e o roteiro é bem trabalhado ao fazer humor tocando nesses pontos. Igualmente irônico é quando os aliens, autofagistas, também conservadores e que primam por seguirem todas as regras e costumes, usam um manto com a bandeira do Reino Unido, fazendo referencia ao Brexite; o fator de isolamento; de auto consumismo e que deixa a comunidade europeia de lado; voltando ao tradicional estado das coisas que parecia ter ficado no passado. Inerente ao movimento punk, a contestação é importante em contraponto porque surge da visão de um mundo que não possui sentido, mantido por poderes fora do controle de quem o vê de baixo. O amor entre os dois é punk porque se sobrepõe a regras supremas de não se misturar. A evolução do garoto e da garota, assim como do restante dos personagens, se dá pela mistura entre alies e humanos, afirmando que diversificação é a saída para um mundo mais desenvolvido.Essa mistura começa quando Zan inunda Enn com a luz amarela refletida por suas roupas e se completa quando, mais a frente, ela retira a roupa amarela alienígena e passa a se vestir como uma humana, se tornando mais próximo a ele. Todos os rebeldes da periferia de Londres liderados por Queen Boadicea (Nicole Kidman) se juntam à causa do casal e ajudam na construção do primeiro amor assim como no amadurecimento dos dois. Junto a esses seres também está muita musica boa, como já é de costume nos filmes de Cameron Mitchell. Basta lembrar-se de “Hedwig – Rock, Amor e Traição” e “Shortbus”. Os anos 70 são representados pelas músicas e a narrativa é orquestrada por elas, principalmente no duo feito pelo casal no terceiro ato.
Com toques surreais em sua mise-en-scène e diferente em suas propostas, “Como Falar com Garotas em Festas” é uma surpresa indie que merece ser conferido, afinal, apesar de sua estranheza inicial, é apenas uma história de amor que toca em pontos como evolução humana, diversidade e quebra de paradigmas para uma sociedade melhor. Como diz a garota em um momento: seu mundo é mais sujo, menos colorido e menor do que eu imaginava, mas, mesmo assim, é uma joia.
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.
honestamente eu gostei muito do filme, toda a sua subjetividade é compreendida, como um romance de um punk e uma alien. Toda a formação de humanidade que a mesma constrói é algo espetacular e por ser um filme independente eu vi muita qualidade.
e você deu uma belissima critrica.