Se Arthur Conan Doyle tivesse nascido no século XXI, será que Sherlock Holmes seria diferente? Talvez, encantado com os movimentos feministas da atualidade, Conan Doyle tivesse escrito a história de uma mulher detetive, ao invés do personagem conhecido há mais de 130 anos. Portanto, para que os leitores sentissem o gostinho de uma versão feminina de Sherlock, a escritora Nancy Springer pediu uma licença simbólica ao grande autor e lançou uma série de livros sobre Enola Holmes, a irmã mais nova do detetive. Deu tão certo que a Netflix decidiu fazer a adaptação cinematográfica de um deles, e chamou a estrela de “Stranger Things” Millie Bobby Brown para protagonizá-lo.
Já nos primeiros minutos do “Enola Holmes” da Netflix, fica claro que a escolha de Bobby Brown foi acertada. A talentosa atriz consegue dar um ar de inocência a uma personagem que é brilhante como seu irmão, e que também poderia ser tão arrogante quanto ele, o que não é o caso. É certo, contudo, que mesmo que o roteiro estivesse cheio de demonstrações de arrogância por parte de Enola, ainda assim ela seria adorável apenas por ter as feições da jovem intérprete. Para aproveitar todo esse carisma, a narrativa é abarrotada de quebras da quarta parede, o que faz com que o espectador vire cúmplice da heroína em sua jornada e se interesse por cada um de seus obstáculos e enigmas, principalmente nos que envolvem Sherlock (Henry Cavill), Mycroft (Sam Claflin) e a mãe (Helena Bonham Carter), os mais difíceis de superar.
Enola foi criada, educada e treinada em esportes e artes marciais pela mãe, que ficou com a garota em uma casa de campo depois da morte do pai da família, e da mudança dos dois filhos para Londres. Desde pequena a garota foi ensinada a ser independente e fazer coisas sem precisar da ajuda dos outros. A quebra da quarta parede citada acima, inclusive, é outra prova de sua autossuficiência, porque ela não conversa com espectador, e sim consigo mesma. Faz perguntas para a câmera, todavia as respostas sempre vêm de dentro dela. Ou seja, do seu subconsciente. A reflexão e a dedução são seus superpoderes que também se tornam prisões solitárias. Isso só muda quando ela conhece por acidente o jovem Lorde Tewksbury (Louis Partridge), por quem se enamora.
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Há, de fato, um clima de romance depois do encontro com o Lorde, mas esse fica em segundo plano. O que importa é a emancipação e o amadurecimento de Enola como mulher antes que Mycroft a transforme em uma lady ou, em outras palavras, em uma serva da sociedade machista da época. Além disso, ela terá que se mostrar à altura de Sherlock, que começa a ver nela um talento para a profissão de detetive. São tarefas complexas, porém necessárias para a formação de uma verdadeira Holmes.
A complexidade, no entanto, fica apenas no subtexto, já que no quesito cinematográfico, tudo é bem simples e direto, como a direção de Harry Bradbeer, que aproveita bem as cenas de ação para mostrar as habilidades de Enola sem qualquer afetação ou exagero. As câmeras estão nos lugares certos para não atrapalhar a concepção espacial das cenas. Mesmo a montagem ao estilo de videoclipe não é um problema porque está de acordo com a jovialidade da protagonista. Por outro lado, muito do que já é mostrado nas entrelinhas visuais é repetido pelo texto dito pelos atores, o que acaba ofendendo a inteligência do espectador.
De resto, “Enola Holmes” usa sua competente linguagem POP para falar de temas caros às mulheres. Com certeza, os alvos são aquelas que mais precisam de orientação e informação: as adolescentes da mesma faixa etária de Enola.
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