No catálogo da Netflix, “Lá Vêm os Pais” aparece entre os títulos em alta. Seja porque o público realmente está empolgado com a nova comédia estrelada por Adam Sandler, seja porque a distribuidora talvez esteja mexendo os pauzinhos para engrandecer a produção da casa – afinal, pouco ela fala sobre seus números de audiência –, o fato é que o material, como muitos dos deploráveis filmes “Original Netflix”, não tem qualidade para tanto.
O triste é que o longa, o primeiro de Robert Smigel na direção, não inspira os piores sentimentos; claro que, como é de se esperar, tem piadas detestáveis, mas boa parte do tempo só é insosso. A trama não é nada mais que um amontoado de temas passados e repassados que já não tenhamos visto: Kenny Lustig (Adam Sandler) é o patriarca de uma família de classe média que, apesar das limitações financeiras, quer honrar a tradição e custear a festa de casamento da filha mais velha, Sarah (Allison Strong). Desde “O Pai da Noiva” (1950), dirigido por Vincent Minelli há mais de 60 anos, explorar o lado cômico da ansiedade que o casamento dos filhos provoca não é mais novidade.
O caminho que segue o projeto, então, é do batido confronto entre pais, outro lugar comum desse quase-gênero que é “comédia de casamento”. No caso, o antagonista é Kirby (Chris Rock), pai do noivo (Roland Buck III), e, ao contrário de Kenny, um homem abastado que sempre pôde proporcionar uma vida confortável a seus familiares por causa de seu trabalho como cirurgião. Assim, ao longo da semana que antecede a celebração, acompanhamos o protagonista ultrapassar os obstáculos mais absurdos – desde estocar garrafas de bebida gigantes a atacar a prefeitura com morcegos – para entregar um evento que agrade não só ao jovem casal, mas que seja aceitável aos olhos do médico. Como não poderia deixar de ser, sua dedicação irá fazer o ricaço refletir sobre a sua própria relação com seus entes queridos.
Depois das bombas que foram “Os 6 Ridículos” (2015), “Zerando a Vida” (2016) e “Sandy Wexler” (2017) – “Os Meyerowitz: Família Não se Escolhe” (2017) foi uma exceção –, Adam Sandler e Netflix têm se mostrado uma combinação indigesta. O grande feito do novo filme da Happy Madison Production, porém, é ser mais próximo do medíocre do que os demais.
Ainda assim, “Lá Vêm os Pais” sofre com sua incompetência. Escrito a quatro mãos pelo ator e Smigel, o roteiro é uma combinação de eventos absurdos que pouco impressionam, personagens que não convencem e piadas que não funcionam. Além, óbvio, de inconsistências – nem é preciso dizer que a divisão dos acontecimentos em dias é dispensável e só serve para o filme fingir que é mais interessante do que é na verdade.
Nada parece assentar. Ideias minimamente audaciosas – mínimas, porque o script é preguiçoso demais para qualquer perspicácia –, como a sequência em que o médico de Chris Rock faz uma cirurgia enquanto discute ao telefone se os convidados da festa de casamento vão comer peixe ou carne vermelha, são sacrificadas por um humor juvenil e tiradas de mau gosto. Qualquer tentativa de inteligência dessa cena vai pelo ralo quando o personagem faz uma piada sobre o tamanho do órgão genital de seu paciente.
Quando não é constrangedora, a comédia apenas não funciona. Ao longo das desnecessárias duas horas de duração, a dupla de roteiristas insiste em querer arrancar risadas com gags fracas, como nas diversas vezes em que ouvimos Kenny e a esposa (Rachel Dratch) gritar um com o outro fora do campo ou quando ele, e em outra situação Kirby, confunde pessoas negras que passam pela calçada da sua casa com integrantes da família do genro.
O problema mais grave do roteiro, entretanto, é a construção dos personagens. Mesmo comprometido em criar humor situacional, o filme esquece da boa estrutura daqueles que irão conduzi-lo, o que cria aberrações narrativas, como fazer com que figuras que deveriam ser relevantes para trama pouco contribuam para ela. Caso de Tyler, o noivo, que, além ter menos desenvolvimento do que o amante latino-americano da sua mãe, parece não sofrer com a negligência emocional do pai e do antigo namorado de Sarah (Jared Sandler), que vem para provocar conflito, mas na verdade só se sai peso-morto do enredo.
Como diretor, Robert Smigel faz um trabalho modesto, mas incapaz de operar milagres. Há boas decisões, como o uso da câmera na mão para melhor emular a atmosfera de vida doméstica, mas também escolhas sem critérios, como o uso do jump cut – pequenos saltos que geram uma transição brusca entre planos. Para que investir em um recurso e depois abandoná-lo? Soa completamente aleatório.
Refinado perto de pérolas da filmografia de Adam Sandler como “Cada um tem a Gêmea que Merece” (2011), “Lá Vêm os Pais” constrange, mas não o suficiente para ser lembrado. Para isso, talvez ele tivesse que aumentar o tempo dele de tela vestido de mulher.
Ainda bem que isso não aconteceu.
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.
Sem comentários! Seja o primeiro.