O extremismo religioso é uma das principais causas dos crimes de ódio na sociedade contemporânea, seja por meio de ataques terroristas ou por repressões governamentais em países não laicos. O sofrimento e a morte de inocentes tornaram-se frequentes, tudo em nome de Alá ou de qualquer outro Deus presente em escrituras tão antigas quanto fabulosas. Claro que a responsabilidade pelo sangue derramado não pode cair nas costas de todos os fiéis dessas religiões, já que os criminosos são uma minoria deturpadora das escrituras “sagradas”.
Mas, quem são os principais soldados desses terroristas? Quem são os enganados pela lábia de líderes com interesses escusos, e que entregam suas vidas à causa? O filme “O Jovem Ahmed” responde a essas perguntas de forma clara: são os jovens ainda em formação intelectual e psicologicamente. A obra de Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne é mais uma tentando entender a cabeça de pessoas que cometem atos extremos em nome da fé, e provavelmente não será a última ao sair de uma Europa ainda assustada pelos acontecimentos violentos recentes, e que deixaram inúmeros mortos em seu solo.
É interessante notar a forma como a Europa abordou o problema de ter seu modo de vida atacado por um inimigo destrutivo. A primeira consequência foi o revide pela força, depois, quando a poeira abaixou, procurou-se entender o inimigo, analisando-o e estudando suas motivações por meio da história e da sociologia. Já a arte o abordou através da reflexão. Dito de outra forma: após os inúmeros ataques terroristas feitos por jihadistas ao mundo ocidental, a força bélica de países europeus e dos EUA protagonizaram as respostas, em seguida também apareceram inúmeros estudos, livros e filmes sobre o tema, como esse dos Dardenne.
Só que o filme dos irmãos belgas não procura o sensacionalismo ou tenta indicar um único vilão como em algumas produções que trataram do tema. Como sempre, eles buscam uma impressão de realidade ao seguir seus atores em planos sequência, ou mantendo longos takes contemplativos. Os cineastas são meros espectadores em um mundo que não proporciona respostas fáceis. O objetivo em “O Jovem Ahmed” é acompanhar o seu protagonista em um caminho de aprendizado, sem impor a ele qualquer tipo de julgamento, no entanto mostrando-o as consequências de seus atos cruéis.
Para essa jornada, era preciso a escalação de um ator competente, e Idir Ben Addi dá conta do recado. Ele consegue construir um Ahmed que parece inseguro em suas ações, ao mesmo tempo em que se mostra firme nas suas convicções sobre os ensinamentos do alcorão. O seu andar desengonçado e a fala tímida definem a ingenuidade agredida por idéias maléficas e que vêm de agentes do terror disfarçados de homens de Deus. O roteiro dos Dardenne o cria, o molda e o entrega na história de forma intensa, e o ator mirim passa por todo o processo convincentemente.
Aliando a boa atuação do protagonista com a direção sempre exemplar dos Dardenne (ganharam o prêmio de direção em Cannes), “O Jovem Ahmed” é cinema de qualidade e de importância política e social. Deveria ser mostrado nas escolas da Europa e do mundo, para conscientizar e alertar os jovens que pretendem seguir uma religião tão maltratada por ideias obscuras vindas de indivíduos criminosos, e não do alcorão.
* Este filme foi visto durante a 43ª Mostra de Cinema de São Paulo.
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