Ao recriar um clássico da literatura que data de 1904 é de se esperar que o universo no qual a trama se insere seja avesso à realidade de nossos dias. Avanços tecnológicos, filosóficos, éticos… Avanços que nos colocam em um lugar diferente em todos os sentidos… será? A releitura teatral do clássico O Mambembe (escrito por Arthur Azevedo e José Piza) mostra que o lugar do ator no Brasil ainda está muito longe de ser valorizado.
O espetáculo musical montado por Rubens Lima Jr. conta, a partir da história da protagonista Laudelina, a saga de uma trupe teatral que se que se aventura excursionando pelo sudeste brasileiro em busca de novas plateias e experiências. Laudelina é uma jovem amante da arte do teatro e muito talentosa. Criada por sua madrinha, se encanta com a ideia de viver dos palcos, mas sua cuidadora (que a incentiva até certo ponto) acredita que é uma jornada perigosa, considerando a mentalidade da época sobre a profissão. No entanto, o renomado empresário Frazão convida a menina para sair em um Mambembe como primeira dama de sua trupe de teatro. A revelia da madrinha, a moça decide partir para viver daquilo que ama. E com ela partem sua madrinha e seu apaixonado Eduardo.
A vida nos trilhos e nas novas cidades por onde passam vai muito bem até a chegada em Tocos, onde conhecem o coronel Pantaleão: Um homem de posses megalomaníaco que passa a complicar a vida da trupe e, em especial, de Laudelina.
O trabalho musical do espetáculo é digno dos grandes sucessos em cartaz na capital do Rio, tanto pela qualidade melódica e letras, quanto pelo trabalho vocal dos atores. Afinados e alinhados, o elenco apresenta um trabalho consistente que envolve o público nas divertidas canções tão levemente interpretadas. O mood dos números é despretensioso, mas com uma qualidade indiscutível. E essa característica cria uma atmosfera leve e cômica que permeia todo espetáculo. Com coros bem realizados e solos potentes, é um espetáculo que merece ser ouvido. Soma-se a isso um trabalho de música ao vivo alinhado e preciso, tornando a qualidade ímpar.
Para um musical, uma crítica que pode ser traçada é a pouca dança no conjunto. Diferente de alguns outros trabalhos em cartaz, onde se tem bailarinos que cantam e atuam, neste é nítido que são atores que cantam e dançam. Não explorar o virtuosismo na dança não chega, porém, a fazer falta. Um trabalho coreográfico mais simples criou uma uniformidade que não expôs nenhum integrante, e ainda assim atendeu bem a proposta geral do espetáculo, tornando tudo mais próximo a uma realidade (divertida) possível.
Não é por isso, por outro lado, que o trabalho corporal não foi bem empregado. A boa opção adotada foi a percussão corporal. Realizada sempre por uma grande quantidade de atores em marcações limpas, não só foi lindo de ver como também entusiasmante. Essa opção reforçou um ar regional também embutido nos figurinos e cenário.
Ao retratar as vestimentas dos idos 1900, a produção dos figurinos (encabeçada por Rick Barboza) seguiu uma paleta pastel que (juntamente aos adereços de Edjane Guimas) traziam um ar de cordel à cena. O resultado estético de grande qualidade endossa o sentimento de unidade cultural nacional e pertencimento.
O cenário móvel permitiu diversas composições cênicas e foi operado e integrado à narrativa de forma inteligente e prática. O trabalho de iluminação conversou afinado com o cenário, permitindo o desenvolvimento de cenas bastante estéticas e divertidas (como o uso de sombras, por exemplo).
Outra característica interessante da montagem é a inserção de referências atuais nos diálogos, ampliando o ar cômico. A adaptação do texto realizada por Alexandre Amorim soube mesclar as décadas e gerar comicidade no comparativo (por vezes desanimador) entre as mesmas. O espetáculo também se rende a uma linda homenagem às grandes atrizes brasileiras, emocionando a plateia.
O espetáculo fica em cartaz no Teatro João Caetano (no Centro do Rio) e merece a sua visita! É diversão garantida.
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