Mão na massa
Dinheiro traz felicidade? Para James Adams, ex-funcionário da Alpha Managers, uma grande empresa de consultoria financeira nos Estados Unidos, ele trazia culpa. Em seu trabalho, ele fazia pessoas gastarem dinheiro: somas astronômicas em investimentos muitas vezes equivocados para elas, mas benéficos à empresa. “Waffle Street” é baseado na história real de James, que após ser demitido, resolveu tentar algo completamente diferente em sua vida – um trabalho que para ele deveria ser acima de tudo honesto e ético – e acabou cumprindo mil horas de serviço na Papa’s Chicken and Waffle, a sétima maior rede de restaurantes nos Estados Unidos.
Antes mesmo que apareça qualquer imagem na tela com exceção dos créditos iniciais, ouvimos a voz do protagonista repetindo sucessivamente algo que ele mesmo chamava de mantra: “O que nós fazemos é legal, logo não é antiético. Se fosse antiético, seria ilegal”. Em seguida, em uma sala de reuniões, vemos as futuras “vítimas” de uma ousada aplicação financeira, completamente desconhecedoras do prejuízo que irão ter. Mas o semblante de James já indica que ele está vivendo um dilema.
O ator James Lafferty convence bem no papel de “almofadinha” do mercado financeiro que aterriza como um extraterrestre em todos os ambientes onde procura emprego. Ele quer um trabalho “blue collar”, ou seja, de por a mão na massa, e isso inclui até mesmo uma tentativa em uma oficina de automóveis, onde trava um diálogo absurdo ao entregar seu currículo ao mecânico que só fala espanhol e que acredita estar diante de um cliente, não de um candidato a uma vaga.
A esposa de Jim (como James é chamado a maior parte do tempo) é Becky, interpretada por Julie Gonzalo. Embora as atuações de ambos sejam corretas, o que intriga um pouco são as atitudes dos personagens: mesmo em momentos de crise eles parecem contidos, como se a interpretação dos atores fosse um pouco calculada ou racionalizada demais. Falta um certo vigor cênico para tornar críveis as emoções de ambos. Será que na vida real o casal, durante a vivência da história que nos é contada, era tão comedido assim? Já os funcionários e frequentadores do Papa’s Chicken and Waffle possuem uma dimensão humana mais visível, como Jacqui (Yolanda Wood), o ex-presidiário Manuel (Sila Agavale), e o carismático chapeiro Edward (Denny Glover). É da boca deste último que sai uma frase que resume seu amor pelo trabalho: “O que você ama tanto que faria de graça?”
Boa parte do filme é narrada pelo protagonista. Ele conta sua história desde o começo, enquanto aparecem na tela fotos e vídeos de infância e adolescência para justificar seu argumento de ter sempre sido “diferente” (quando criança escolheu se fantasiar de gênio da matemática no Halloween). Os mesmos recursos visuais são utilizados para contar a trajetória de seus antepassados de origem humilde.
Takes de situações que se repetem num mesmo local são muito usados para mostrar a rotina de Jim. Não há grandes ousadias na direção conjunta de Ian e Eshom Nelms e as locações na maior parte do tempo se resumem ao restaurante e à casa do personagem. Isso pode parecer um pouco enfadonho, mas o foco está mesmo na narrativa e nos acontecimentos que se sucedem: James estava empenhado em comprar o restaurante onde trabalhava. Para tanto, deveria cumprir um número específico de horas e enfrentar várias tarefas, incluindo desentupir uma privada apenas com as próprias mãos e muita coragem. Impossível não admirar a persistência de James e principalmente, a humildade que teve para aprender uma função completamente diferente da que estava habituado e a gratidão em relação a tudo que o processo lhe proporcionou.
“Waffle Street” pode ser comparado a um daqueles livros que abordam crescimento profissional e empreendedorismo, só que mais divertido.
https://www.youtube.com/watch?v=E4A1LWWGkaA
Neuza Rodrigues
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.