Assistir a um filme com um título como “Z: A Cidade Perdida” é imaginar que vamos embarcar em uma aventura épica com direito a civilizações nunca encontradas, objetos arqueológicos amaldiçoados e um explorador boa pinta, ostentando um chapéu cáqui. Mais um pastiche dos filmes de aventura na década de 1930, que ganhou peso com Harrison Ford interpretando o arqueólogo na franquia “Indiana Jones”.
Entretanto, no novo projeto comandado por James Gray as coisas são um tanto diferentes. Há uma sociedade ancestral, há um galã uniformizado, mas nada disso ao dispor da fantasia. Pelo contrário: à Charlie Hunnam foi proposto o desafio de encarnar Percy Fawcett, um militar inglês que no começo do século passado entrou em uma expedição na Amazônia com seu filho e nunca mais foi encontrado. Ele acreditava na existência de uma cidade perdida no meio da floresta, até então nunca encontrada pelo homem branco.
O material é um prato cheio para uma grande odisseia, o que de fato se torna, mas surpreende por, em vez de seguir o caminho do extraordinário, ancorar essa história na dureza da realidade. Todavia, se essa característica distingue a produção, comprometer-se com a vida real também a leva a tropeços.
Adaptada do livro homônimo escrito pelo jornalista da The New Yorker, David Grann, a trama parte de 1903, quando o jovem Major Percy Fawcett é convocado pela Royal Geographical Society (RGS) para uma missão a fim de ajudar o governo inglês a definir as fronteiras entre a Bolívia e o Brasil. Vendo a oportunidade de ganhar uma medalha e resgatar o nome de sua família, o rapaz embarca em sua primeira expedição à Amazônia. Ao lado de Henry Costin (Robert Pattinson) e sua tripulação, ele não só sobrevive à falta de comida, às doenças tropicais e aos ataques de tribos nativas, como encontra evidências da existência de uma civilização antiga. Trazendo suas teorias na volta para a Inglaterra, o soldado passa a dedicar sua vida a encontrar o que ele chama de “Z”, uma cidade perdida no meio da floresta. Obstinado, seu objetivo não só repercutirá na relação com sua esposa Nina (Siena Miller) e com seus filhos, mas também como toda sociedade inglesa o enxerga.
“Sonhar, buscar o desconhecido, contemplar o que é belo é a nossa única recompensa. As conquistas de um homem devem exceder suas pretensões, caso contrário, para o que serve o paraíso?” Nina escreve ao marido em sua primeira viagem. Delicado como os versos da personagem é o trabalho de James Gray na direção, que em parceria com o veterano Darius Khondji na direção de fotografia, conseguiu capturar uma essência do cinema feito no começo do século passado. Um filtro amarelado nos transporta para uma vida em outra época, o escorrer de uma gota de uísque transforma-se no movimento do trem que corta a floresta, a memória afetiva no prado inglês é intercalada com a grandiosidade da vegetação amazônica, suas águas, sua luz.
Porém, se “Z” é um projeto com cara de clássico, ele se sabota ao não lembrar que seu protagonista não é um herói da ficção. Antes de militar e de um explorador, Fawcett foi humano, sujeito a falhas. Encarando a obsessão do personagem como um propósito acima do bem e do mal, mesmo que suas ações fossem vistas negativamente pelas pessoas a sua volta – como os membros da RGS acreditando que sua ideia é insana ou seu filho frustrado pela sua ausência ao longo do anos –, o filme parece sempre condescendente com sua postura. Sua obstinação nunca é posta à prova o suficiente, mas vista apenas como um destino heroico que ele não pode escapar.
Densidade dramática e maior desenvolvimento também faltam a algumas figuras da história. Robert Pattinson é talentoso em compor Henry Costin como um homem leal de poucas palavras. E só. O roteiro não abre brechas para conhecê-lo melhor e não aprofunda sua relação com o personagem principal. Menos ainda Arthur Manley (Edward Ashley), que morre nas trincheiras durante a Segunda Guerra Mundial, mas jamais sentimos o peso de sua perda já que ele serve apenas como acessório à história.
O mesmo já não é possível de dizer de Siena Miller, que tem espaço para encarnar Nina com suavidade e inteligência. Um dos subtextos mais interessantes do filme, inclusive, é a discussão sobre gênero, quando a moça pede para acompanhar o marido na expedição e recebe uma resposta negativa. Depois disso, o tema não volta a ser discutido, afinal, naquele período é preciso se contentar em exercer o papel que é delegado a qualquer mulher: ser submissa e não querer assumir a linha de frente de qualquer outra coisa que não a vida doméstica.
Romântico na abordagem, “Z: A Cidade Perdida” não segue o modus operandi dos filmes de aventura e não consegue evocar a multiplicidade de seu protagonista como em um bom drama. Alternando entre o deslumbre de sua estética e, muitas vezes, o enfado em sua narrativa, a única certeza que se tem ao deixar o cinema é ter recebido uma boa lição de história.
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