A história do Cinema Mundial mostra que as décadas de 40, 50 e 60 foram marcadas pelas grandes vanguardas. Algumas delas, por exemplo, foram: o precursor Neorrealismo Italiano, no qual surgiu nomes famosos como Roberto Rosselini, e a Nouvelle Vague francesa, com figuras que se tornaram conhecidas como Godard, Truffaut e Agnés Varda.
Esses diversos movimentos tinham como grande característica a experimentação. Os diretores percebiam o formato hermético dos filmes produzidos, feito por ricos e alienados da realidade social. Um grande exemplo dessa configuração criticada foi Hollywood, com ápice de seu cinema clássico no ano de 1939. E então, eles quiseram quebrar com esse sistema e mostrar outras possibilidades de cinema.
Isso também ocorreu nos Estados Unidos. Interessados no cinema underground e querendo inovar, jovens cineastas independentes se uniram e começam a “fazer barulho”: conhecido como o New American Cinema. Queriam um cinema autoral, que ninguém interferiria, tomando medidas legais para que pudessem mostrar e publicar o que desejavam.
Assim, os anos 60 ganhou atenção para a “revolução dos independentes”, que assumiu a aparência de um movimento unificado. Para anunciar o desenvolvimento do New American Cinema foram publicados manifestos, organizadas reuniões e grupos com a intenção de reunir condições que deviam permitir a criação de um cinema americano em oposição a Hollywood, no plano temático e estético.
Influenciados por esse movimento, em torno dos anos 70, surge uma nova geração que bebe dessas pessoas anteriores. Assim, eles atuam e “botam para quebrar”. Manifesta-se um cinema extremante rico, que vai se inspirar todos esses movimentos anteriores. Vão mostrar drogas, negros, homossexuais, e muitos outros pontos que eram proibidos pelo código Hays.
Em meio a essas produções, aparece um filme independente que hoje é considerado clássico: “A noite dos mortos vivos”. Dirigido por George Romero, um dos “pais” dos filmes de terror e progenitor do subgênero “apocalipse zumbi”. É uma grande influência de arquétipo zumbi para a cultura popular moderna.
Uma pequena sinopse do filme: uma grande quantidade de radiação se espalha devido a queda de um satélite. Por conta dessa contaminação, diversos mortos saem de suas covas como zumbis, atrás de alimento: pessoas. O núcleo principal é um grupo de setes pessoas que encontram refúgio em uma casa de campo, na região rural da Pensilvânia. Durante o tempo juntos e presos ali, precisam lutar pela sua sobrevivência e impedir a entrada dos mortos vivos.
O filme deu origem a outros cinco, também dirigidos por George Romero. Além disso, houve refilmagens homônimas do clássico, como “A noite dos mortos vivos”, de 1990 e “A noite dos mortos vivos 3D”, de 2006.
É um longa-metragem ímpar dentro dos filmes de gênero. A produção tem diversas características de um filme independente: foi todo feito em um sítio, bancado pelo próprio pessoal e usando amigos no elenco. Mesmo assim, diversos elementos podem ser destacados neste filme como direção de atores, fotografia e roteiro.
O filme é muito importante pelas suas abordagens, principalmente sendo considerado a época em que foi feito. No entanto, esses podem ser, muitas vezes, não perceptíveis ao espectador comum, que não possui um olhar que procura os detalhes. A forma de assistir uma obra como essa deve-se ir a fundo em suas diversas camadas. Conseguindo atingi-las, é possível compreender a inclusão de alguns desses elementos, auto explicando suas importâncias. Por isso, foram selecionados para esse post alguns pontos da produção.
“Quem avisa amigo é”: as análises a seguir contêm SPOILERS, partindo daqui fica por conta da sua curiosidade:
1. Personagem principal: a escolha do personagem principal ser um negro vai contra a grande maioria dos que circulavam na época. O mais importante é a desconstrução feita ao colocá-lo como o único sã, em meio a todos os acontecimentos. É ele “a cabeça pensante” daquele grupo, levando em consideração o bem estar de todos, e nas possíveis ações para retirá-los dali. Enquanto isso, os demais são extremamente individualista, com a única missão sendo salvar a si mesmo.
2. Sociedade patriarcal: o longa metragem é muito inteligente em diversas de suas construções. Uma delas é a seleção do patriarcalismo. Uma característica muito defendida pela sociedade norte-americana, que coloca a figura paterna acima de todos, reafirmado em muitas produções de Hollywood. No filme, quando todos os personagens entram dentro da casa, forma-se como uma “família” ali. No entanto, é abordado a maneira como esse núcleo se autodestrói, se desfaz ao longo do decorrer dos acontecimentos. Uma cena muito marcante quanto a isso é a que a menina, mordida por um “morto vivo”, devora os próprios pais.
3. Mídia: Outro elemento que merece destaque é o papel da mídia, e como é analisado seu poder. A todo momento, dentro da casa, os personagens acompanham o mundo lá fora através da televisão e do rádio. Essa abordagem é uma forma de retomar a crítica sobre a ação midiática durante a Guerra do Vietnã, uma das mais televisionadas da história. Ou seja, a morte de muitos indivíduos foi comercializada, se tornando mercadoria em frente as câmeras.
4. Morrer de vez: Uma característica do filme é a solução de morte dos “mortos vivos”. Para serem exterminados é preciso que se destrua sua cabeça, o local do pensamento. Uma crítica ao poder do Estado, que foi o grande responsável pelo desenrolar do acontecimento da história, errou e colocou em risco toda sua população, a quem, na verdade, deveria proteger.
5. Chega de Happy Ending: O final do filme complementa tudo isso com uma crítica, através da morte do personagem. O negro é o único sobrevivente e está ali à espera do resgate. Esse é formado por homens brancos do interior, portando armas, quase que infalíveis, figuras como “super-heróis” que irão salvar a todos. No entanto, estão na verdade cegados pelo medo. E são esses homens “racionais” quem assassinam esse personagem. Um tiro certeiro, como uma mosca, ou seja, uma morte completamente estúpida. Percebe-se então a crítica: matar inocentes, sem saber ao certo quem realmente são.
Fica a dica para o final de semana. Se você já tiver visto, reveja com outros olhos buscando detalhes. Caso não tenha assistido, pode investir em tirar uma hora e meia do seu dia para apreciar esse longa metragem.
Por Gabi Fischer
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