“Ei, Satoru.
Desde que a gente partiu, eu já conheci duas cidades onde você cresceu. Já conheci uma vila de agricultores. Conheci o mar.
O que mais a gente vai ver até o fim desta viagem?”
Simples. Esse é o melhor adjetivo que eu poderia dar a este livro. Parece fraco, não é mesmo? Entretanto, eu te garanto que não poderia estar mais longe da realidade.
Em “Relatos de um gato viajante”, acompanhamos Satoru Miyawaki viajando pelo Japão e visitando seus melhores amigos com um objetivo em mente: encontrar alguém para adotar seu gato. Alguém que fosse cuidar dele com tanto amor quanto ele mesmo. E se precisamos confiar em alguém, confiamos, claro, nos nossos melhores amigos.
Ao mesmo tempo, acompanhamos Nana viajando pelo Japão visitando os melhores amigos de seu dono com um único objetivo em mente: curtir a viagem e a companhia. E se vamos viajar tanto assim, claro que queremos a companhia de alguém que gostamos muito, como nosso melhor amigo.
“Que felicidade poderia ser maior do que esta? ”
Simples, não? E é assim que essa simplicidade brilha: enquanto a narração alterna entre os personagens, incluindo Nana, vemos essa história ir além de reencontros e viagens. Descobrimos uma história sobre os laços que nos une, sobre relacionamentos e, acima de tudo, sobre amizade.
Partindo das dinâmicas entre as personagens, vemos como a amizade verdadeira é altruísta. Como o passado não precisa nos assombrar e pode se tornar um tempero para a vida. Como a existência pode ser frágil, mas, mesmo assim ou até mesmo, por causa disso, possui um valor inestimável para aqueles que nos cercam.
Você pode estar pensando (com razão) que não tem nada de simples nisso. Afinal, não há nada mais complexo do que as relações, certo? Mas é aí que a Hiro Arikawa faz a leitura valer a pena…. Nós, humanos, pensamos demais nos significados e significantes. Já Nana relata por meio de sua percepção felina a verdade sem rodeios, preto no branco, e muitas vezes com uma graça e uma objetividade que levamos anos para adquirir.
“Onde já se viu um coroa desses falar ‘gatinho fofo’?
Ele já ia se afastar, mas não aguentei vê-lo ir embora chateado. Ergui a cabeça e soltei um miado. Lá fora, Satoru sorriu.
– O senhor gostaria de brincar um pouco com ele? ”
Deste modo, o livro segue. Sendo de fácil leitura e munido de personagens cativantes aliados a uma narrativa objetiva, acabam se passando poucos dias até que ele seja devorado. Mas não se assustem ao se deparar com temperos amargos, meus amigos. Afinal, não existe uma refeição completa sem estar acompanhada de um festival de sabores, algo que Arikawa construiu de modo espetacular.
E foi enquanto pesquisávamos a autora, uma renomada escritora de best-sellers no Japão que ganhou até adaptações para a TV e o cinema, nos deparamos com a informação de que este não é um de seus melhores livros. Uma informação esta que, para ser sincero, me deixou feliz. Apesar de ser a primeira tradução para o português, gostaria de encontrar outras obras tão interessantes quanto, mas com uma atenção maior para a tradução e revisão. Um exemplo disso é o uso da palavra “mestre” sempre que um animal se refere a seu dono. É impossível deixar de sentir a intimidade da relação construída entre eles ser comprometida pela escolha de uma palavra que não reflete a mensagem da obra. Mas é só um detalhe que não diminui em nada a experiência. Afinal, como o próprio Nana coloca em um certo momento:
“Sou seu único gato, Satoru. E você é meu único companheiro”.
Por Pedro Soler
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