Você já parou para pensar que os anseios femininos as quais discutimos tão ardentemente hoje, outrora já eram colocados na Literatura de Clarice Lispector, a nossa grande dama da arte literária brasileira?
A forma como ela articulava a subjetividade das suas personagens, tempos depois foi nomeada existencialista. Este tipo de pluralidade não era permitido às mulheres, este ardor que emerge das situações cotidianas sempre classificou a todas elas como loucas, histéricas, frágeis e desprovidas de qualquer senso intelectual racionalmente falando.
“A Hora da Estrela” , seu último romance lançado em 1977, quando ela ainda estava viva, discursa através da desconstrução do próprio artista que escreve, partindo princípio que este tem todo o direito de se confundir com a própria arte que produz.
A própria relação de troca que a autora possui com a personagem Macabéa;- e ao pensarmos de forma padrão, nada tem a ver com a escritora estabelece uma certa simbiose entre a narradora e aquele que é narrado. Às vezes, a ficção se confunde completamente com a realidade entre as aventuras da protagonista alagoana e a introspecção quase em forma de diário da nossa querida autora ucraniana radicada no Brasil desde pequena na década de 20.
Seus contos também dialogam relativizando o cotidiano atirando-o em um redemoinho de sensações e sentimentos pouco explanados nas novelas, quase sempre escritas por autores homens, muitos deles brilhantes, mas, lhes tornava impossível divergir sobre a existência a partir de um ponto de vista feminino. Isso significa dizer que a finalidade do sujeito enquanto sujeito é existir, mas a visão da escritora nos traz outro sentido a essa preocupação. Podemos citar muitos deles tais como “Laços de família” ou mesmo na linha infantil em “Cem anos de perdão”, – onde ela ressalta que aqueles que nunca roubaram uma rosa poderão entendê-la – encontramos esses aspectos desesperadores e as urgências por viver experiências que nos deem motivos a mais que os meros comuns para dar outro sentido às nossas vidas, tão miseráveis.
A esta altura, pode ser que o leitor esteja pensando que esta problemática não é inquietude da Literatura feminina. E Clarice não é. Porém foi uma grande escritora que preparou essa narrativa com foco nas escolhas. Quando, a mulher, permitiu-se o benefício da escolha? Quando foi? Hoje o é? O compartilhamento das emoções por todos os seres humanos, assim como a eleição individual de cada um a respeito do que deseja ser simbolizavam o homem como indivíduo. Quando se coloca a ela como sujeito singular, evidenciam-se outras alternativas ao gênero feminino. E assim o fez Clarice Lispector, construindo personagens masculinos e femininos dotados de humanidade desde sua mirada como mulher. Talvez esse comportamento tenha sido necessário para reconstruir a vida, pois foi uma escritora que floresceu no período do pós-guerra.
Sua arte pode ser apresentada de inúmeras maneiras, mas algo que não se pode negar é a vivência que a autora demonstra desfrutar junto às personagens dos seus livros, sendo destinada a chorar e a amar junto com elas, como podemos perceber na longa prosa ficcional “Água viva”, texto lançado em 1973, que se perde no tempo transgredindo o dia-a-dia. Sem dúvida, esta grande autora transgrediu a criação literária. Somente por este motivo ela poderia ser nomeada a nossa grande dama da Literatura Brasileira. Mas existem inúmeros outros.
Confira apenas algumas outras obras de Clarice Lispector (1920+1977) e vocês entenderão:
Perto do coração selvagem (1943)
A maçã no escuro (1961)
O mistério do coelho pensante (1967)
A mulher que matou os peixes (1968)
Quase de verdade (1978)
Um sopro de vida (1978)
” (…) Deus é o mundo. A verdade é sempre um contato interior e inexplicável. A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não tem uma só palavra que a signifique.” A Hora da Estrela
Por Susana Savedra
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