Num ano seguido pela falta de indicação de negros ao Oscar e Donald Trump, “Até o último homem” (Hacksaw Ridge) vem como uma piada de mal gosto.
O filme, sob direção de Mel Gibson, que já possui há alguns anos vários escândalos morais e pessoais, vem como mais um, a essa pilha. Ainda que já acumule alguns prêmios é difícil acreditar que alguns, como atuação, coadjuvante e melhor filme, não tenham sido mais uma escolha política que estética.
A história conta recortes da vida do médico de guerra Desmond T. Doss (Andrew Garfield), que decide ir para o front, mas não pegar em armas, pois sua fé não o permite.
Seguindo a linha de toda falácia dos republicanos em 2016 para escolher seus candidatos, o filme tenta dar argumento à cristofobia. Procura apaixonadamente mostrar a vida sofrida de um cristão e como é dura sua realidade para ter fé. Tantos clichês são usados, como a mulher enfermeira que espera pelo marido na guerra, o heroísmo que só pode ser um milagre de Deus, e Desmond Doss opera inclusive um milagre ele mesmo ao “dar visão” a um soldado. Em outras palavras, o filme procura mostrar como é difícil ser branco. “Até o último homem” parece ser o front contra “Moonlight: Sob a luz do luar“, “Eu não sou seu negro“, “Estrelas além do tempo“, “Um limite entre nós”, “A torre negra e United Kingdom”, que protagonizam o negro, a discriminação e a desigualdade em suas histórias e no casting.
Como quase todo, no entanto, mostra qualidade no som e nos efeitos especiais, com exceção em algumas partes com chroma key. A edição e direção também são boas, mostrando ao menos que Mel Gibson anda mantendo essa característica – pensando que talvez faça “Esquadrão Suicida 2″. Os lugares onde filmaram são muito próprios ao tema, ainda que muito limitados, assim como o figurino. Não sai muito da norma de maneira geral, inclusive em como o japonês é retratado.
Os dois atores mais presentes, Andrew Garfield e Vince Vaughn, vêm de um filme e uma série quase que desastrosos, “O espetacular homem-aranha 2: a ameaça de Electro” e “True Detective” (segunda temporada), o que talvez possa levantar suspeitas de orçamento.
No fim, o filme não demonstra novidades. Tenta glorificar o soldado que salvou mais de 70 pessoas no campo de batalha e que seguiu firme em sua fé contra todas as chances de falha, sendo, dessa maneira, o receptáculo do milagre de Deus na Terra. Com certeza deve haver público para isso nos EUA e – por que não? – no resto do mundo. O que nos resta de bom a tirar dali é pelo menos a atitude pacifista de alguém que queria apenas salvar vidas: americanas ou japonesas, de dentro da máquina de matar da guerra.
Por Paulo Abe
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