Um exercício cinematográfico
Em 1940, durante a Segunda Guerra Mundial, forças militares britânicas e francesas foram encurraladas por um violento ataque alemão na cidade portuária de Dunkerque. O confronto dizimou milhares de pessoas, mas uma pequena diminuição no embate foi suficiente para um inesperado plano de evacuação que ficou conhecido como “Operação Dínamo”. Durante dez dias seguidos, diferentes embarcações fizeram o impossível para resgatar o máximo de soldados antes que a resistência fosse quebrada e causasse um número ainda maior de mortos. O fato levou o nome de “A Batalha de Dunkerque”. Entretanto, em meio a tantos outros acontecimentos nessa que foi considerada – em sua totalidade – a maior guerra de todos os tempos, o conflito gerado a beira da praia de Dunkerque tornou-se apenas mais um evento ignorado pelo tempo.
Todavia, independente do tamanho do mesmo, é nele que o cineasta Christopher Nolan aposta todas suas fichas para abraçar a sua mais recente produção a chegar aos cinemas. “Dunkirk” é uma imersiva experiência sobre o momento, a luta pela sobrevivência, criada com sensatez e sem manias de grandiloquência. O enredo conta o necessário, a partir de três instantes que se cruzam: Uma tensa semana na praia, na qual vemos a determinação de um jovem soldado tentando escapar do perigo da guerra; Um dia inteiro em alto mar, com um pai, seu filho e outro adolescente que fazem de tudo para cumprir o trabalho de participar do salvamento; e uma turbulenta hora no céu, onde acompanhamos a luta de um perseverante piloto focado em abater os aviões inimigos que estão impedindo a evacuação. Durante essas três narrativas criadas, somos apresentados a um lento e angustiante resgate que te deixa roendo as unhas a cada crescer da trilha sonora.
Produzido por Jake Myers (“O Regresso”), Christopher Nolan (“Interestellar”) e vários outros nomes importantes do cinema americano e francês, o filme aporta como um trabalho metódico, tentando ser o mais realista possível. Somos surpreendidos com efeitos visuais de primeira linha, mas não são eles que nos tiram o fôlego e, sim, todo o conjunto da obra que invade a nossa mente desde do início, com uma impressionante sequência de abertura.
O próprio Nolan fica a cargo do fascinante roteiro, trabalhado de forma completamente não-linear. Sem precisar definir um único herói, que rouba a trama para si, ele se concentra na dramaticidade dos acontecimentos em um todo, direcionando o olhar do público para o grande personagem do filme: a evacuação. Ao mesmo tempo o roteirista opta por uma escolha interessante, não se apoiar em diálogos fortes e/ou determinantes para a obra, algo que engrandece ainda mais o filme tornando-o bastante visual e reflexivo.
Reconhecido por trabalhos audaciosos a frente dos excelentes “Amnésia”, “Batman – O Cavaleiro das Trevas”, “A Origem”, entre outros, Christopher Nolan constrói um verdadeiro exercício cinematográfico nessa epopéia sobre a evacuação traçada pela Operação Dínamo. Como diretor, ele incorpora enquadramentos significativos, que valorizam a gigantesca operação em sua totalidade, sem querer glamourizar e muito menos inferiorizar o episódio ou seus personagens. Desde os inquietantes planos sequências, até os nauseantes movimentos de câmera durante os ataques, a cada cena, somos encantados por um criativo e sufocante jogo psicológico causado por Nolan, que faz de tudo para colocar o espectador realmente dentro das cenas.
E isso torna-se ainda mais possível com a assombrosa fotografia criada por Hoyte Van Hoytema (“Deixe ela entrar” e “007 contra Spectre”), toda realizada em 70mm. O trabalho não só valoriza a textura das cenas, como permite uma sensação de proximidade mais poderosa. Sem falar que a composição das cores e tons escolhidos por Hoytema, juntamente com os majestosos planos abertos que prestigiam as enormes paisagens, ajudam a criar uma atmosfera que deixa o espectador perplexo do início ao fim. Um complemento bastante funcional para o bom desempenho do departamento de arte e o significativo serviço prestado por Jeffrey Kurland (“Colateral”), como figurinista.
Embora traga Tom Hardy, Mark Rylance, Kenneth Branagh e Cillian Murphy no elenco, o filme pertence mesmo aos rostos desconhecidos de alguns atores com destaque, como Fionn Whitehead, Damien Bonnard e Aneurin Barnard.
O mestre Hans Zimmer, conhecido por obras incontestáveis, não desenvolve somente uma simples trilha sonora para o filme, mas um apocalíptico e deslumbrante concerto de sons que encaixa perfeitamente com a magnífica e ensurdecedora edição e mixagem de som traçadas para a obra. É provocante, continuado, como um momento de tensão que nunca acaba. Tanto que quando o silêncio impera pela primeira vez, a respiração se torna mais leve e graciosa.
“Durkirk” não é apenas um grande filme, mas um dos melhores dos últimos anos. Uma experiência sensorial inesquecível e amplamente indicada para quem gosta de cinema no seu mais puro momento. Um poesia para os olhos e mente.
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