Parece que, em 2018, tão certo quanto as fases da lua, uma vez por mês a Netflix lança um longa original medíocre de ficção científica. A plataforma de streaming já torturou a sua audiência com bombas como “The Cloverfield Paradox”, “The Titan”, “Anon” e “Mudo”, e a sua nova arma de destruição em massa se chama “TAU”, uma produção confusa sobre inteligências artificiais que além de não trazer nada de novo para o gênero, falha em realizar o básico de discussões que já foram feitas por diversos outros filmes.
“TAU” segue a história de Julia (Maika Monroe), uma mulher que mora sozinha e ganha a vida revendendo os itens que furta em boates. Ela é atacada por um homem e acorda amarrada, junto com mais duas outras pessoas, em uma jaula eletrificada em um laboratório cientifico. Quando consegue escapar, a protagonista se descobre na mansão de um rico inventor (Ed Klein) que deseja continuar os testes que estava fazendo com ela, e usa o seu computador, a inteligência artificial TAU (Gary Oldman), para manter a jovem presa no local. O que o antagonista não espera, porém, é que ao invés de aceitar a sua situação, a personagem principal começa a construir uma amizade com a máquina que controla a casa.
Desde a sua introdução, que parece um videoclipe, até a sua conclusão canastrona, a direção de Federico D’Alessandro é competente em um nível técnico, mas é uma bagunça em questão de tom. O longa tem vários aspectos que se aproximam do gênero do terror mas que falham em criar qualquer tipo de tensão quando colocados a esmo entre momentos de comédia leve. Desse modo, uma sequência de sonho que termina em um susto, que está no filme para lembrar a audiência de que a protagonista está com medo, entra em conflito com o restante das cenas, que não apresentam qualquer indício de algo fora do normal. Essa discrepância chega a limites extremos quando, no clímax, que deveria ser impactante e levado a sério, é colocado o infame “grito de Wilhelm” – efeito sonoro utilizado em mais de 300 produções – que já é cômico por natureza.
Por conta desse conflito tonal, as atuações também sofrem. Maika Monroe, interpretando Julia, em metade das cenas não parece se preocupar em estar presa na casa de um estranho psicótico, e o mesmo pode ser dito de Ed Klein, que vive o cientista Alex, que parece estar entediado com a própria voz no decorrer da história. O maior nome do elenco é do recém vencedor do Oscar Gary Oldman, que faz apenas a voz da inteligência artificial, um papel que provavelmente aceitou porque poderia gravar todas suas falas em um dia e não seria tão trabalhoso assim.
Nenhum dos atores é ajudado pelo roteiro, escrito por Noga Landau, que apesar de ter apenas três personagens, tem a proeza de não desenvolver nenhum deles. Até tem alguns detalhes interessantes no script, como a habilidade da protagonista de furtar, que é estabelecida no começo e utilizada ao longo da trama, mas eles ficam perdidos em meio a uma história que não faz muito sentido e cheia de buracos. Por que um dos prisioneiros tenta abrir a porta com reconhecimento de digitais? Ele achou que seu carcereiro tinha dado essa permissão? O que exatamente Alex está coletando? Por que ele explica seu plano e as fraquezas de seu sistema operacional para uma mulher (que mantém em cativeiro) na qual não confia? Por que o TAU em algumas cenas insiste que deve obedecer seu criador mas ao mesmo tempo quebra suas regras arbitrariamente? Por que a casa tem um botão de autodestruição? Por que o cientista não paga pessoas para serem cobaias humanas ao invés de sequestrá-las? Por que nós devemos nos importar com o prazo de seu projeto? A maioria dessas perguntas pode ser respondida com “enredo fraco”.
Para não dizer que o longa é um desastre completo, ele tem um design de produção que é interessante, e os efeitos visuais do próprio TAU são decentes, mas não é nada que exale originalidade. A computação gráfica utilizada em Aries, o robô que guarda a casa, porém, é vergonhosa e parece ter saído diretamente de uma produção de tubarão do SyFy. O mesmo pode ser dito da maquiagem de Julia, que continua linda mesmo após ser atacada seguidas vezes pelo sistema de segurança. Nem mesmo a fotografia de Larry Smith é impressionante, e na tentativa de fazer algo moderno e chamativo, fica apenas monocromática e incompreensível.
Por fim, a última desventura de ficção científica da Netflix é um desastre tedioso, que, como de costume para essas produções, parece mais preocupada em demonstrar o design de todas as suas tecnologias inovadoras do que de fazer uma história com sentido. Já é possível agrupar todos esses longas e inaugurar o gênero “Black Mirror exploitation”.
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