No limite do exagero
O ano era de 1991, e o cinema recebia um filme que se tornaria um clássico da aventura. Dirigido por Kathryn Bigelow, com duas estrelas do mercado, ali nascia uma produção que atrairia fãs de todo o mundo, tornando-se inesquecível aos olhos de cineastas, críticos e o público. Caçadores de emoção, título em português para Point Break (termo usado no mundo do surf para indicar famosos picos de onda), trazia Patrick Swayze e Keanu Reeves envolvidos em uma trama sobre coragem, admiração e, claro, perseguição. E eu não estou falando de uma perseguição comum, e sim manobras radicais retratadas através de tubos e outras peripécias que somente um filme como esse pode trazer. Pois bem, 25 anos se passaram e um remake encomendado pelos estúdios chega hoje aos cinemas de todo Brasil se apoiando no que antes fora inesquecível.
Dessa vez, sem o charme dos antigos protagonistas, o filme se segura em suas cenas realistas e efeitos de primeira linha para contar a história de Johnny Utah, um esportista e aventureiro que após perder um grande amigo, decide mudar o rumo de sua vida e entra para o FBI. Anos depois, seu conhecimento coloca-o frente à frente com um caso que poderá reviver suas mais profundas emoções. Ao ser direcionado, Utah se infiltra em um grupo de esportistas “Zens” radicais, em busca do melhor que a vida possa oferecer, para encontrar os responsáveis por diversos e impossíveis roubos ao redor do mundo. Contudo, na tentativa de provar sua lealdade, acaba mantendo fortes ligações com Bodhi, líder do grupo, e a bela Samsara.
Os mais de dez produtores, conseguem oferecer ao projeto um calibre que não foi recebido na primeira tentativa. Com um alto budget (75 milhões de dólares a mais no orçamento), foi possível construir incríveis e inimagináveis cenas de ação, sendo grande parte trabalhada de forma real com verdadeiros atletas profissionais no lugar de dublês para algumas cenas. Sem contar belíssimas locações em diferentes partes do globo possibilitando, nesse quesito, um salto ainda maior em relação ao primeiro.
Se na produção o filme se destaca, o roteiro tropeça cometendo o primeiro dos pecados de um remake ao tentar diferenciar-se do original oferencendo mais do que sua força estrutural suporta. Embora, no início, o filme nos convença mostrando um ar mais sério e um motivo plausível para a destreza da personagem de Johnny Utah nos esportes, a partir dali a ladeira começa a ser mais íngreme transformando grandes possibilidades em uma infinidade de clichês. O filme até oferece um argumento certo para essa história, explicando um pouco mais sobre os reais motivos por trás dos roubos (por mais que muitos possam discordar dessas possibilidades, elas existem em vários lugares do mundo), colocando uma teoria de limite e superação. Entretanto, acaba acumulando o complexo de Robin Hood que já virou moda em diferentes scripts espalhados pelo mundo. Não digo isso pelo fato de estar batido, e sim pela forma usada para costurar a história. E, nesse caso, o roteirista Kurt Wimmer falha ao pegar uma boa história e engrandece-la mais do que precisava, além de querer criar um novo super agente aos moldes de alguns espiões espalhados por aí (até o menos cinéfilo vai perceber toques de Missão Impossível e 007).
A direção de Ericson Core também escorrega durante toda projeção, no que diz respeito a cinema, mesmo que tenha intrigantes planos e movimentos de câmera de gelar a espinha daqueles que sofrem de vertigem, nao sabemos se estamos vendo um filme, o canal de esportes ou um grande comercial das cameras GoPro e/ou marcas de cigarro da decada de 90. Todavia, para quem gosta de ação e aventuras impossíveis, Core se tornará um ídolo pois consegue oferecer bastante realidade a cada uma das cenas.
O elenco não funciona muito bem, outro pecado cometido pela produção. A começar pelo carisma que soa completamente forçado, nenhum dos atores consegue demonstrar o lado psicológico e emocional que as personagens exigem (pelo menos não sem se tornar exagerado e/ou caricato). O charme, oferecido originalmente, escoa aos poucos no decorrer da projeção. Edgar Ramirez, por melhor ator que seja, não convence como Bodhi que é um personagem determinado, conectado com a vida e o que ela pode oferecer. Luke Bracey também soa artificial na sua construção da personagem, tenta se recuperar no decorrer do filme, mas falha, como já disse antes, por sua completa falta de carisma (Nesse momento, como gostaria que o Keanu Reeves da década de 90 tomasse emprestado a cabine telefônica do “Bill e Teddy” e viajasse no tempo para interpretar Utah). A belíssima Teresa Palmer, mal aproveitada no filme, é outro caso de caricatura, ficando a desejar. Delroy Lindo e Ray Winstone, coadjuvantes na história, conseguem se destacar mais que o resto do elenco nas poucas cenas que aparecem.
A fotografia trabalhada pelo próprio diretor, Ericson Core, se encaixa melhor no filme do que seu trabalho de direção. Todavia é necessário lembrar que esse é seu carro chefe profissional. Ericson, consegue criar com perfeição uma conexão entre a composição das cores, tons e os efeitos, com ângulos milimétricos que fazem a diferença e fornece mais realidade as cenas de ação.
A ótima trilha sonora, foi trabalhada com sabedoria por Junkie XL, gerando um ar jovial para uma história antiga. Contudo me fez ter certeza de que o filme foi feito para jovens com sede de adrenalina e viciados em videos de Youtube.
Caçadores de emoção – Além do limite tinha tudo para ser um sucesso ainda maior que o original e ficar na memória do público como seu antecessor, mas peca em seus excessos e falta de criatividade. É um blockbuster divertido, que funciona em muitos aspectos e vale o ingresso do cinema. Até merece uma continuação, mas que precisa ser retratada com um outro olhar.
https://www.youtube.com/watch?v=2UovmUsVRNE
Daniel Gravelli é um brazuca que parle français e roda uns filmes por aí. Apaixonado pelo universo da escrita, tem um caso com o teatro e morre de amores pelo cinema. Fotógrafo e crítico nas horas vagas, gosta de cozinhar, apreciar um bom vinho e trocar ideias interessantes.
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