Inversão de gênero em forma de sátira
As pessoas mais conscientes da realidade sabem que vivemos em um mundo no qual a figura masculina exerce predominância. A sociedade é amplamente controlada por homens que, em grande medida, subjugam as mulheres ao seu bel-prazer, seja no âmbito familiar ou no profissional. Embora tenha ocorrido uma reação feminina a partir do movimento Me Too, muito ainda precisa ser feito para que a igualdade e o respeito entre os gêneros sejam efetivamente alcançados. Partindo desse contexto de domínio patriarcal, a cineasta Anna Muylaert decidiu, em “O Clube das Mulheres de Negócios”, contar uma história que inverte os papeis tradicionais. No filme, ela constrói um universo paralelo onde as mulheres são as figuras dominantes e tóxicas, enquanto os homens se tornam suas vítimas.
A intenção de Muylaert é claramente tecer uma crítica à sociedade, fazendo com que cada homem que assista ao filme experimente, mesmo que de maneira minimizada, a desconfortável vivência que muitas mulheres enfrentam cotidianamente. Assim, neste tal de clube de negócios, situado em um resort de luxo, os homens são objetificados, sofrem assédios morais e físicos, e são tratados como criaturas frágeis e ingênuas, necessitando da proteção do sexo considerado “mais forte”. Existe ainda uma referência irônica ao próprio cinema, quando a câmera da cineasta foca, em close, as nádegas dos mordomos, que usam shorts extremamente curtos. Essas cenas remetem a cineastas como Michael Bay, conhecidos por explorar gratuitamente e exageradamente o corpo feminino para satisfazer seus próprios fetiches. Tal abordagem revela o desinteresse em mostrar a beleza das mulheres de maneira significativa, mas sim em expô-las de maneira superficial, sem qualquer propósito narrativo relevante.
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Com esses elementos centrais, “O Clube das Mulheres de Negócios” se desenrola caoticamente, no melhor sentido da palavra, criando uma sátira que inclui personagens que representam figuras amplamente conhecidas no cenário nacional, como Bolsonaro e seus filhos, que se destacam pela obsessão em armas e violência, além de outros milionários decadentes que assediam jovens mulheres com a certeza de que não serão punidos. O enredo ainda conta com a inclusão de três onças como símbolos femininos, que buscam recuperar um mundo que também lhes pertence. O humor negro se faz presente toda vez que as onças aparecem, mas é um elemento permeado por todo o filme, que se torna ainda mais incisivo pelas situações absurdas geradas pelas personagens ricas e poderosas, interpretadas com maestria por Cristina Pereira, Ittala Nandi, Grace Gianoukas, Katiuscia Canoro, Irene Ravache, Priscila Marinho e Shirley Cruz.
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Com isso, o filme de Muylaert é preciso em suas críticas, mas não chega a ser perfeito, pois, por vezes, peca no excesso de verve. Bom, pelo menos é essa a impressão de quem vos escreve, já que outros espectadores poderão facilmente rebater ao dizerem que, por se tratar de uma sátira, nada poderia ser contido ou sutil. E, de fato, esse é um argumento deveras válido.
Este filme foi exibido e visto durante a 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
Imagem em destaque: Divulgação/Vitrine Filmes
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