Horror cósmico, ciclos de abuso, e Marjorie Estiano em um longa na Netflix
Estreou hoje (23/10) o longa “Abraço de Mãe”, horror nacional exclusivo pela Netflix, encabeçado por Marjorie Estiano e grande elenco. Na trama, bombeira retorna ao serviço no resgate após ser afastada, apenas para ser mandada a um misterioso asilo em seu bairro natal, onde terá que confrontar os traumas de sua infância. Confira nossa crítica abaixo, sem spoilers.
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“Vim para que vivam em abundância”
“Quando uma talentosa e querida por todos funcionária se vê tendo que se afastar de sua carreira, o telespectador se vê voltando a um momento do passado para descobrir o que está por trás dos segredos da mente de uma, agora não tão confiável assim, narradora.”
Enquanto o clássico “Perfect Blue” (1997) apenas ao fim se põe irreversivelmente em cheque a sanidade da protagonista, nosso ponto de vista ao mundo e quem, de certa forma, narra sua história, “Abraço de Mãe” opta pela via inversa: algo de muito errado aconteceu com Ana (Marjorie Estiano), e desde o início somos avisados disso.
Apresentados à personagem através de uma sequência que nos leva a um parque estranho, em que mãe (Chandelly Braz) e filha (Ana jovem por Mel Nunes) entram no que seria uma réplica da gigante e quase folclórica Boneca Eva do bairro da Lagoa, Rio de Janeiro. Desde a apresentação do motif de fetos, incentivado pelo próprio título, a caçada para juntar as peças desse grande quebra-cabeças começa.
Nesse filme que tem um quê de circular e oferece bom fator de reassistibilidade, cada vez há novas pistas para instigar um pouco mais a resolução do mistério, que não parece ter um único fim. O longa não se apoia em sustos fáceis para ganhar a audiência, para alegria dos cardíacos, em seu lugar, a atuação sempre impecável de Marjorie Estiano é capaz de amarrar tudo mesmo diante dos absurdos que se desvelem.
“Ik ben gekomen om leven te geven en overvloed”
João 10:10 em neerlandês, como visto em um dos quadros do asilo.
E que isso não seja visto necessariamente como algo negativo. Nesse lugar inóspito, tudo é claustrofóbico: o desconhecimento linguístico, Ana como a verdadeira estrangeira entre estrangeiros (tal como a heroína, não entendemos necessariamente as falas em castelhano e chinês, sem legenda), o argumento que é, em alguma medida, também circular — visto que Ana faz duplamente vezes de filha, mas também de mãe, frente a sua parceira de cena Lia (Maria Volpe); onde a protagonista deixa de ser cada coisa e onde começa e termina o real?
Se o filme não captura tanto assim a audiência pelo remix de tropos de horror psicológico, ficamos pelo mistério e pelo carisma do elenco, que não se resume à Estiano, os residentes da decadente espelunca em São Gonçalo são a outra ponta das rachaduras dessa estrutura que está longe de ser apenas física, e ganha vida diante de uma instigante abundância de símbolos no vale da estranheza — eles certamente apontam para uma direção, difícil de ser nomeada como a origem desse horror.
Imagem Destacada: Divulgação/Netflix
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