Filósofos, economistas e sociólogos com vertentes mais progressistas frequentemente analisam as mutações que o trabalho vem sofrendo no mundo atual através do enfraquecimento dos sindicados e da modernização das fábricas que deixam uma multidão de trabalhadores desempregados. Eles também vivem dizendo que o capitalismo financeiro a serviço de acionistas milionários não se importa se o fechamento de uma fábrica vai destruir famílias inteiras, colocando os últimos pregos nos caixões dos menos favorecidos. Afinal, os investidores querem o aumento de seus dividendos provindos das ações. Em outras palavras: se tal fábrica não dá lucro, a cartilha capitalista rentista diz que os seus “papeis” devem ser “pulverizados” na bolsa, ou ela precisa ser exterminada.
Este processo de destruição do trabalho é bem elucidado por “Em Guerra” de Stéphane Brizé (“O Valor de um Homem”, 2015), que mostra o movimento de um sindicato de trabalhadores que tenta impedir que uma fábrica alemã de autopeças seja fechada em uma pequena cidade francesa. Laurent Amédéo (Vincent Lindon) é o líder sindical que chama uma greve e reúne os operários para reivindicar o cumprimento do acordo de manutenção dos empregos feito com os patrões nos anos anteriores, quando a crise da empresa já era evidente. Amédéo é o típico líder sindical que, ao estilo Lula, consegue a admiração de seus pares ao colocar pressão nos empresários que fogem de qualquer reunião ou reparação de danos frente a uma multidão descontente. Em reação a isso, o sindicato organiza manifestações e reuniões com membros do governo para resolver o problema, mas os burocratas sempre saem pela tangente.
Durante um dos encontros, o CEO da empresa deixa claro que a demissão de mil e cem pessoas se deve à pressão feita pelos acionistas, que ao analisarem os dados, constataram que a fábrica deverá ser desativada porque fica abaixo das outras do grupo no quesito produtividade e lucro. A partir daí, a guerra entre o povo e o capitalismo se intensifica. O curioso, no entanto, é que povo não pede nada além de seus trabalhos de volta, ou seja, eles querem se manter ativos como capitalistas. O problema é que o capitalismo dos acionistas é diferente do dos trabalhadores. Enquanto um é o financeiro moderno (dinheiro gera dinheiro) o outro é o antigo baseado na máxima: mercadoria gera dinheiro que gera mercadoria… Os banqueiros e investidores pulam a mercadoria no processo; então para que mão de obra excessiva?
Brizé, junto de Olivier Gorce, leram muito sobre crises econômicas e sociais para escrever “Em Guerra”, já que o roteiro é uma exposição das más práticas empresariais que podem desestabilizar toda uma sociedade. Como exemplo, há um momento que a estratégia de oferecer dinheiro a alguns trabalhadores, para que esses fiquem contra a greve, é posta em prática, o que gera desunião e coloca o movimento em risco. Apelar para as necessidades individuais contra o coletivo é típica do neoliberalismo tão celebrado pela minoria rica do planeta. Enquanto isso, as desigualdades sociais crescem dia a dia como consequência de um capitalismo predador.
Se o texto de Brizé é como uma dissertação política e econômica que toma partido, sua direção é documental, com câmeras sempre filmando escondida por detrás de ombros ou escondida no meio da multidão. Talvez, com isso ele queira interferir o mínimo possível para que as vozes de seus personagens, principalmente a do poderoso protagonista – interpretado por um sempre competente Lindon – sejam destacadas, ou tenha a intensão de fazer da câmera uma das trabalhadoras indignadas com as ações dos poderosos. Bem, o fato é que “Em Guerra” define bem os vilões de sua história, ainda mais com um final impactante que obriga a reflexão até dos menos politizados.
Este filme faz parte da seleção do Festival Varilux 2020, e pode ser conferido no link a seguir até o dia 27 de agosto: http://festivalvariluxemcasa.com.br/
https://www.youtube.com/watch?v=4ewwv4R2hrs
Vídeo e Imagens: Divulgação/Supo Mungam Films
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