Origem da vilã de 101 Dálmatas peca pelo excesso no estilo mas pela falta na substância
Para contextualizar o processo que nos trouxe a “Cruella”, vale voltar uns anos no passado. Em “Star Wars: Episódio I – A Ameaça Fantasma”, Hollywood descobriu o quão profícuo é o prólogo. Não demorou muito para virar filão. Assim como Darth Vader teve sua origem contada primeiro episódio da space opera de George Lucas, outros vilões ganharam seus preâmbulos. A Disney tratou de aproveitar o modelo e nele encaixar uma icônica vilã, Malévola.
Interpretada por Angelina Jolie, a bruxa de “A Bela Adormecida” fez bonito nas bilheterias revigorando seu status pop. Observando o potencial das prequels, a Disney foi na sua vasta galeria de vilãs e escolheu a maior inimiga dos dálmatas (e dos amantes da raça canina) para ganhar seu filme solo live action.
Em “Cruella”, a jovem Estella (Emma Stone) é uma menina órfã que cresce nas ruas de Londres vivendo de golpes junto com seus comparsas Jasper e Horácio. Seu talento como estilista nunca recebe o devido valor, até que ela encontra a grande chance de sua vida ao ser notada pela Baronesa. No entanto, uma reviravolta ligando a aristocrata a um acontecimento do passado da jovem as transforma em antagonistas, o que vai acarretar a transformação de Estella em Cruella De Vil.
Quando foi divulgado o trailer muitos apontaram que a protagonista seria a Arlequina da Disney. O filme apaga essa impressão. No fim das contas a comparação mais pertinente é com Malévola. Vemos a vilã da Disney em uma trama que a coloca como anti-heroína e expõe elementos e fatos que moldaram a personalidade que conhecemos. O grande problema, que também aflige o prólogo de “A Bela Adormecida”, é justamente contar uma história que não precisava ser revelada. Há personagens que dispensam maiores explicações sobre seu passado. O que nos foi contado em “101 Dálmatas”, tanto a clássica versão animada de 1961 quanto seu remake com uma magnífica Glenn Close em 1996, era suficiente e satisfatório.
A direção de Graig Gillespie (de Eu, Tonya) tenta o tempo todo compensar com agilidade e maneirismos o imenso vazio do roteiro de Dana Fox e Tony McNamara (que assinou o script do excelente “A Favorita”). Desnecessariamente longo e com um desenvolvimento de personagens rasos, lança mão de uma portentosa direção de arte e um deslumbrante trabalho de figurino para encher os olhos, além de uma trilha sonora imbatível (com sonzeiras de Queen, Blondie, Rolling Stones, Eletric Light Orchestra, The Clash) para encher os ouvidos. Já a ambientação de época, a Londres dos anos 1970, pouco acrescenta à trama, que tem um terço final problemático que sintetiza a falta de rumo do roteiro.
Emma Stone (que também assina como produtora) segue o ritmo frenético da câmera e da edição, compondo uma versão punk da personagem satisfatória na maior parte do tempo, mas escorregando no cliché da menina rebelde em vários momentos. Joel Fry e Paul Walter Hauser criam as versões iniciais de Jasper e Horácio até com certa graça, mas sem muita generosidade por parte do roteiro para torná-los um pouco mais que alívios cômicos. Já Emma Thompson brilha, ainda que sua Baronesa carregue todos os trejeitos da Cruella de Glenn Close. No fim das contas seria uma forma de mostrar quem foi a grande inspiração da futura vilã.
“Cruella” se perde em sua proposta e peca pelo excesso no estilo mas também pela falta na substância. Com isso, vai ser difícil emplacar a versão jovem da personagem no hall dos ícones do estúdio, por mais que o produto seja envolto em uma bela embalagem e, claro, nos obrigatórios easter eggs. O principal, uma boa história, acabou sendo deixado de lado.
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