Para acalentar os corações dos fãs e angariar novos!
A primeira parte do filme “Wicked” chega aos cinemas nesse fim de semana e ele nada mais é que uma “adaptação” de outras adaptações. Então vamos de resumão para quem não faz ideia do que estamos falando:
Em 1900 foi lançado o livro “O Maravilhoso Mágico de Oz”, escrito por L. Frank Baum e ilustrado por W. W. Denslow. O sucesso foi tão grande que em 1902 ganhou sua primeira adaptação como musical chamado “O Mágico de Oz”. Extremamente aclamado, seu autor chegou a escrever mais treze livros adicionais sobre o universo de Oz, que servem como sequências oficiais da primeira e clássica história. Em 1939, “O Mágico de Oz” virou o filme que todos nós conhecemos, onde fomos apresentados a Judy Garland, indicado a seis Oscars e vencedor de dois.
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Muitas décadas depois, em 1995 para sermos mais exatos, Gregory Maguire, inspirado pelo clássico livro (e filme), escreveu “Wicked: The Life and Times of the Wicked Witch of the West”. Nele, o foco é contar a história antes da chegada de Dorothy em Oz. Ele trouxe à tona a origem da Elphaba, a Bruxa Má do Oeste, e Glinda, a Bruxa Boa do Sul. Como, sendo completamente diferentes, elas se conheceram, se tornaram amigas e como seus caminhos se separaram para cada uma tivesse “seu lugar” naquele universo mágico. A recepção da obra não demorou muito a cativar o público e, em 2003, “Wicked” vira um musical da Broadway.
“Wicked: A História Não Contada das Bruxas de Oz” (Wicked: The Untold Story of the Witches of Oz) teve suas canções compostas por Stephen Schwartz e texto de Winnie Holzman. A produção ganhou 3 Tony Awards, 6 Drama Desk Awards, e 1 Grammy por seu álbum de canções do elenco, que originalmente tinha Indina Menzel (“Rent!” | 2005), como Elphaba, e Kristin Chenoweth (“Convenção das Bruxas” | 2020), como Glinda. Ambas só saíram de seus papeis em 2020, quando as apresentações foram suspensas devido a Covid-19. Ao retornar aos palcos em 2021, as atrizes Lindsay Pearce e Ginna Claire Mason foram escaladas como como Elphaba e Glinda. Ao longo desses mais de 20 anos em cartaz, “Wicked” quebrou recordes, se tornou o segundo musical de maior bilheteria da Broadway e foi adaptada/apresentada em 16 países, incluindo o Brasil.
Falando sobre nossa “versão brasileira”, “Wicked” esteve em cartaz por duas vezes aqui. A primeira vez foi em 2016, onde foi a primeira produção em português, a primeira montagem sul-americana, e maior cenário do mundo já montado para o musical. Na segunda vez, em 2023, não foi uma réplica do musical da Broadway, mas uma adaptação, com novos cenários, figurinos etc., ainda preservando as canções e o texto original. Para ambas as versões, tivemos as atrizes Fabi Bang, como Glinda, e Myra Ruiz, como Elphaba. As apresentações foram sucesso absoluto de público ao ponto de Fabi e Myra, que nos cativaram em seus papeis, serem as dubladoras oficiais das personagens no filme. Aos fãs da versão brasileira, já foi anunciado que em 2025, Wicked voltará a ficar em cartaz, em São Paulo.
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Agora vamos ao que nos interessa: o tão aguardado e falado filme, que depois de anos sendo planejado, estudado, escrito e reescrito, com mudanças de equipe e elenco ao longo de quase 20 anos, enfim chega aos cinemas. Sim, a ideia de se ter um filme de “Wicked” existe antes mesmo do musical ser criado. Seus direitos foram originalmente comprados pela Universal Pictures em 1996.
O primeiro acerto da produção foi não transformar a história em um único filme. Assim como o musical, o longa é dividido em duas partes e a segunda só tem previsão de estrear em 2025. Mas ao contrário do espetáculo que dura certa de três horas ao todo, nas telas temos 2h40 só para iniciar a brincadeira. Pode parecer absurda a diferença se compararmos diretamente suas durações, mas o tempo de absorção em um teatro e em um cinema são diferentes. E aí outro ponto assertivo, a direção de Jon M. Chu (“Podres de Ricos” | 2018) e o roteiro de Winnie Holzman e Dana Fox (“Cruella” | 2021) não só soube respeitar essa diferença de tempo, como trouxe aprofundamento às personagens e ao mundo de Oz. Ter tempo hábil de se contar uma história é primordial para uma boa recepção.
O roteiro segue bem fiel ao que conhecemos da obra (musical), mas ganha novos contornos com as possibilidades cênicas que o cinema proporciona. Tanto em ação, quando em criatividade argumentativa. Se um musical é feito em suma de cantos e danças, no cinema é preciso mais que isso para cativar e entreter, sua base textual precisa ser bem enxuta e focada naquilo que alcança seu público. Rindo ou chorando, sim, vocês podem passar pelos dois momentos ao longo da exibição, as roteirista usam e abusam dos clichês cômicos de maneira positiva, buscam o silencio da ação para emocionar e aprofundam as emoções das personagens.
Junto ao olhar preciso e utópico de Jon M. Chu, escolher “o que” e “como” contar, prova que faz diferença. Depois de outras experiencias musicais, ele sem dúvida se põe no panteão das direções do gênero. Sua narrativa visual é leve, precisa e você não vai ver o tempo passar. Claro que tem o dedo mágico da edição de Myron Kerstein (“Tick, Tick… BOOM!” | 2021), mas Jon foi visionário e positivamente megalomaníaco para nos entregar um filme grandioso, que pode encantar aqueles que não conhecem e reencantar os fiéis fãs. E se no início se faz delicado e colorido – spoiler alert – o longa termina sombrio e na aguardada potência de “Defying Gravity”.
A cinematografia de Alice Brooks, é boa e bem realizada, mas nada de novo ou inovador. Talvez seu ponto alto seja valorizar – e muito – os outros departamentos visuais. Os figurinos de Paul Tazewell (“Amor, Sublime Amor” | 2021) são de um brilhantismo riquíssimo em detalhes. Reimaginar e recriar algo que já existe e/ou está no imaginário do publico é um desafio e tanto, mas ele o superou com destreza. Nem sempre nosso olhos conseguiram capitar os mínimos detalhes das peças, mas quando o fazemos, é espetacular. Trazer unidade e harmonia nos visuais de cada personagem de destaque e no coro, junto a caracterização, são um deleite a parte.
Se Paul pode ser um forte concorrente ao Oscar de Melhor Figurino, Nathan Crowley – gravem esse nome – pode ser o favorito a Melhor Design de Produção. Esse mestre é só o responsável pelo Design de Produção da “Trilogia Batman”, “Interestrelar | 2014”, “O Rei do Show | 2017”, “Dunkirk | 2017” e “Wonka | 2023”, só para citar alguns. Sua genialidade visual é tão absurda como a imoderada visão do diretor. Tudo, absolutamente tudo, foi pensado e construído do zero no interior da Inglaterra, incluindo o campo de tulipas que abre o filme. Sim eles plantaram e cultivaram 9 milhões de tulipas.
Obviamente os efeitos visuais estão presentes e são complementares na obra. Nesse vídeo aqui, você consegue compreender a perfeição e a grandiosidade de tudo. Em alguns momentos é visível que é um cenário, que é irreal, mas isso também foi proposital como forma de acessar a memória e representar a teatralidade, visual e cenotécnica, que conhecemos dos musicais. Já nesse vídeo, entendemos que a imersão dessa fantasia também acontecia ao vivo, pois o elenco decidiu cantar em cena. Ou seja, não era só uma filmagem, era também um estúdio de gravação para a trilha que será liberada oficialmente junto com o lançamento do filme.
Temos Jeff Goldblum (“Jurassic World Domínio” | 2022) como o Mágico, Michelle Yeoh (“Tudo Em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” | 2022) como a Madame Morrible, Jonathan Bailey (“Bridgerton” | 2020) como o charmoso Fiyero, e mais uma lista longa de elenco. Mas o filme é de suas protagonistas Cynthia Erivo (“Harriet” | 2019) e Ariana Grande-Butera (“Não Olhe Para Cima” | 2021). Ninguém conseguiu “roubar-lhes a cena” em nenhum momento. Na verdade, no bom sentido da coisa, elas, com suas interpretações, disputam entre si quem está melhor em cena.
Com tons bem diferentes para caracterizar as personagens, juntas ou contracenando com outras pessoas do elenco, ambas sabem exatamente o que estão fazendo e se entregam à história. Ariana usa e abusa de seu carisma e doçura para viver uma “Ga-linda” com vários momentos cômicos e leves. A caricatura da personagem por si só, já conquista o público, mas ela consegue dar seu próprio e único toque. Já Erivo, aposta em oscilações entre a inocência e incompreensão à raiva contida e força. Sua Elphaba passa por momentos de reconhecimento, descobertas, novas emoções e tudo isso com muita sutiliza e empatia. Com olhares super expressivos, os closes de ambas são sempre um deleite.
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Considerado um dos filmes mais aguardados do ano, “Wicked” é sem duvidas uma superprodução memorável. Além de poder ser assistido por toda a família, suas mensagens sobre humanidade, respeito, amizade e coragem são atemporais. Você pode sorrir, chorar e – se conhece as canções – cantar junto. Para quem já leu as obras literárias, sabe bem que essa “inocente magia” é só um disfarce para falar sobre sobre assuntos mais pesados e extremamente humanos. Dito tudo isso, só podemos aguardar ansiosamente pela segunda parte, que pode ser tão boa, se não melhor, que a primeira. Por aqui a expectativa é que a continuação seja bem mais sombria, mas sem perder sua graciosidade. Até lá, talvez “Wicked” – Parte 01 – já seja nosso próximo confort movie.
Imagem Destacada: Divulgação/Universal Pictures Brasil
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